AS RUAS DE POMPEIA – por Francisco da Rocha

 

In memoriam omnium Pompeianorum plebis
perierunt anno LXXIX A.D.
Pompeii, Aestate MMXXI.

Num meio-dia escaldante de Verão,
Perambulávamos pelas ruas desertas de Pompeia
Espiávamos pelas janelas abertas das casas e vilas destelhadas,
Hipnotizados pelos objectos carbonizados e mudas, petrificadas estátuas humanas,
Pestanas semicerradas contra os raios solares omnipresentes
Que pareciam envolver as testemunhas do Passado numa luz ofuscante,
Impressionados diante dos templos vazios, em silêncio pensante,
Ansiosos por ouvir os ecos das orações nunca atendidas,
Pedidos e suplícios dos adoradores de numes há muito extintos. Continuar a ler “AS RUAS DE POMPEIA – por Francisco da Rocha”

TRÊS POEMAS – de Marcelo Torres

ser

pode o ser nas tradições orais ir além das estruturas
feito um pássaro cortês da diversidade,
              ser um animal aqui perto do coração,
não podemos ir adiante enquanto os gigantes mamíferos
             são destruídos em alto mar
                          como conchas pisoteadas por estátuas,
continuar a mimese é o que chamo de obsceno,
os homens predadores sorriem junto com a morte
sem vontade para o debate ecológico,
seguem a lógica de conquistar territórios, de touros de ouro
na Faria Lima sem sonhos,
à medida que ando, o urbano me fere na vesícula
               que reproduz em 3d a fome sem enfeite
ontem encontrei uma garota/totem,
procurava um guia com jipe, para ir na direção das cavernas

(Poema do livro: Infernos Fluviais e por que nunca conversamos sobre Nick Cave?. Editora Clóe, 2023) Continuar a ler “TRÊS POEMAS – de Marcelo Torres”

A MADRUGADA A DOER – de Maria Gomes

Art © Roberto de Mitri

 

A madrugada a doer, a doer-me muito.
Na memória que guarda o teu nome
este cantar lúcido das águas.
Tu és belo como esse canto, esse perfeito tiro ao alvo
ao fundo da noite
perfurando as fogueiras adormecidas.
Que segredo se oculta, em esplendor, onde teu corpo habita?
Quem te nomeia nesse mar tão branco?
O que amas?
A orla do rio, ou a raiz deserta?
A madrugada a doer, a doer-me muito.

♦♦♦

Maria Gomes nasceu em Benguela, República de Angola, em 1958. Foi professora de artes visuais e trabalhou em contabilidade após a independência daquele país. Vive em Coimbra. Tem poemas publicados no Jornal de Angola, nas antologias de Poesia 1 e 2 ” Escritas” sob a edição do poeta José Félix, em outras revistas de literatura na web, e na revista de Poesia de Tradução Di Versos nº 8 de Edições Sempre-em-Pé. Participou no poema ” O Estado do Mundo”, poema criado no ciber espaço, no âmbito de Coimbra, Capital Nacional da Cultura 2003, a editar brevemente em livro, e participou na II e III Bienal de Poesia em Silves, em Abril de 2005 e de 2008.

 

 

ENTRE A LUZ E O CREPÚSCULO – de Maria João Oliveira

LUZ NO CAMINHO

Escutas o silêncio
Para não perderes
O murmúrio dos meus lábios
Um silêncio onde respirar
Se torna mais fácil
Uma transparência que mostra
A areia no fundo do rio

És a Fonte onde os pássaros
Bebem e cantam
E no teu rosto, a Luz poisa
Reconhece-te, pertence-te
Como o perfume pertence à flor. Continuar a ler “ENTRE A LUZ E O CREPÚSCULO – de Maria João Oliveira”

TRÊS POEMAS COM ALGUNS ANOS – de Maria Toscano

 

deste cubículo precário
(a A.M.O.)
.
neste cubículo precário que é o mundo
às vezes falta a brisa. e o ar de tuas mãos.
faltam os olhos de água como sorris
a polpa e a saliva que és, na voz,
a fala feita à passagem dos teus gestos
— de ti: a falta. o encanto e a maravilha.
.
neste precário cubículo que é o mundo
deixas ficar-te em perfume. permaneces.
e é pelos densos poros dos sentidos
que, se não estás, sei o instante
sei o instante em que adormeces.
.
neste precário cubículo que é o mundo
nem tudo falta:
ao viveres-me
és também tu que aconteces.
.
maria toscano.
Coimbra, Café-Pastelaria Tosta Rica. 25 Novembro/ 2003. Continuar a ler “TRÊS POEMAS COM ALGUNS ANOS – de Maria Toscano”

POEMAS DEL LIBRO “POEMAS A LA INTEMPÉRIE” – de Moisés Cardenas

Sin título

El silencio de la lluvia
abrazó los ojos de este león que soy.
Ocultándome en un libro,
sentí el sol sobre las palabras.
De pronto salieron gritos,
la visualización
de la orquídea esperando nacer,
recuerdos,
viejas historias,
miré mis zapatos desgastados,
la botella de whisky vacía,
un poema de Walt Whitman.
Supe el sabor de la lluvia. Continuar a ler “POEMAS DEL LIBRO “POEMAS A LA INTEMPÉRIE” – de Moisés Cardenas”

ORTOGRAFIA DE TU CUERPO – por Francisco Álvarez Koki

Jane Graverol (1905-1984), Le Sacre de Printemps, 1960

ORTOGRAFÍA DE TU CUERPO

Desde aquí pienso…
en los puntos suspensivos y las comas
que sólo conocemos yo y tu cuerpo.
Ahora me invade no sólo la tristeza
sino la geografía del silencio.

YOUR BODY’S PUNCTUATION

From this point I wonder. . .
About the ellipsis and the commas
Only familiar to your body and me.
I’m now filled not only with sadness
but also with the geography of silence. Continuar a ler “ORTOGRAFIA DE TU CUERPO – por Francisco Álvarez Koki”

DEZ POEMAS INDIGESTOS – de Henrique Duarte Neto

 

O ÓPIO DO POVO

No passado, o ópio do povo
era a igreja.
Agora, em tempos mais etílicos,
é a cerveja.

No passado, o ópio do povo
era o capital minimamente disseminado.
Agora, em tempos mais lúgubres,
é o capital exclusivo, privado.

No passado, o ópio do povo
era o bom futebol.
Agora, em tempos mais frívolos,
é reality show, besteirol.

No passado, o ópio do povo
era a ideia do paraíso.
Agora, em tempos mais mercadológicos,
é lucrar, desdenhando o último juízo. Continuar a ler “DEZ POEMAS INDIGESTOS – de Henrique Duarte Neto”

POEMINHOS (51-60) – por Jaime Vaz Brasil

Foto by Edlson Silva

 

 

 

 

 

 

 

51.

Nenhum poema
esgota o tema.

Mas, quando bom,
põe a verdade

em estado
de estando…

52.

Dante, à porta do inferno:
– “Deixai, vós que entrais,
toda a esperança”.

Quintana retrucou, na entrada:
– “Esperança é uma espera que não cansa”.

Eu?
Ora… sentei num banquinho
e não disse nada. Continuar a ler “POEMINHOS (51-60) – por Jaime Vaz Brasil”

TRADUÇÃO E LEITURA DE POEMA DE EUGÉNIO DE ANDRADE – por Maria Toscano

TRADUÇÃO E LEITURA DE POEMA

DE EUGÉNIO DE ANDRADE, 

POR MARIA TOSCANO

VER CLARO
.

Toda la poesía es luminosa,
hasta
la más oscura.
El lector es el que tiene a veces,
en lugar de sol, niebla dentro de sí.
Y la niebla nunca deja ver claro.
Si regresar
otra vez y otra vez
y otra vez
a esas sílabas alumbradas
quedará ciego de tanta claridad.
Alabado sea si allí llegar.
.
Eugénio de Andrade – Prémio Camões 2001.
In “Los surcos de la sed”. Ed. Fundação Eugénio de Andrade, 2001.
Versión al castellano: Maria Toscano, Figueira da Foz, Portugal. 13 enero / 2023.

♣♣♣

VER CLARO
.

Toda a poesia é luminosa,
até
a mais obscura.
O leitor é que tem às vezes,
em lugar de sol, nevoeiro dentro de si.
E o nevoeiro nunca deixa ver claro.
Se regressar
outra vez e outra vez
e outra vez
a essas sílabas acesas
ficará cego de tanta claridade.
Abençoado seja se lá chegar.
.

Eugénio de Andrade – Prémio/Premio Camões 2001.
In “Os sulcos da sede”. Ed. Fundação Eugénio de Andrade, 2001.

 

♦♦♦

Maria (de Fátima C.) Toscano, Doutora em Sociologia. Docente Universitária, Investigadora e Formadora. Coach e Trainer em Programação Neurolinguística.

 

 

Poemas* de Rolando Revagliatti

 

*Poemas de Rolando Revagliatti de su libro ‘Obras completas en verso hasta acá’:

 

Es un chico: no entiende

1

Duerme
                    mujer enroscada: se quedó dormida:
mujer que se queda dormida.

2

Ellos piensan que mi problema es que soy un idiota
Se equivocan: mi problema es que no soy un idiota.

3

Cuando sea grande mi mamá me va a conseguir una novia.

4

Diana Dors
inmiscuye sus tetas de nácar
en mi sopa
¡yeeeeaah!… Diana. Continuar a ler “Poemas* de Rolando Revagliatti”

POEMAS – de Maria Gomes

VICTOR BREGEDA - Past, Present, and Future 
© Victor Bregeda – Past, Present, and Future

 

1

Mais do que deuses, precisamos do limiar do sagrado
do lugar onde bebem as aves,
de regressar ao silêncio de uma noite ida;
mais do que deuses, precisamos do anúncio súbito
da clemência implorada
dos trabalhos do mar;
mais do que deuses, precisamos do homem, da pele do homem,
da sua peugada
sobreposta à penumbra da flor nascida.
Mais do que deuses, precisamos da fronteira da meia-noite
do círculo lunar do grande rio
que corre no sangue da terra humilde. Continuar a ler “POEMAS – de Maria Gomes”

POESIA – de Francis Kurkievicz

 

MAGO

Na floresta para Waldberta
O guia perde o poeta.
Na serpentecostal selva remotta
Um criancião paracleto
O aguardava com sinais cristântricos.
Do cóccix à pineal
Pousou o mestre a mão
E alçou alucifeéricos fogos pecúlios
Despertando-lhe uma pedagogia petrográfica aprendiz.
E o poeta petiz
Reencontrou-se guia apóstata
Ifá de Orumilá.
Axé! Ave! Amém!

Continuar a ler “POESIA – de Francis Kurkievicz”

TRÊS TEMPOS POÉTICOS – de Henrique Miguel Carvalho

by Plato Terentev

CONVIDADO

ao cair
            do astro maior
aguardo,
             felicitações
             remotas

que pelo
            nome
nunca o dizem,
             até que
             — é sempre assim,
um estranho
             de maneiras
             inconcretas Continuar a ler “TRÊS TEMPOS POÉTICOS – de Henrique Miguel Carvalho”

POESIA de – Lua Pinkhasovna

 

Espelho de Afrodite

Entre constelações, esferas rochosas, violentas estrelas mortiças e cintilantes cometas, nascer Vênus pode ser considerado uma afronta ao restante dos planetas
Pisando em trompas, ventres, ovários e vulvas e aquela mistura que poucos sabem ao certo o nome, lambuzo-me de sangue menstrual derramado nas ruas
Há polícia? O que há? Será que alguém me escuta? É claro que não, eu sou notícia corriqueira de uma realidade fantasticamente banal
O sangramento da violência não é repudiado, apenas é visto com asco aquele que mostra que sou um ser próprio, forjada em minha natureza
sem ser sexy, sendo apenas espécie
e que sinto por fora e por dentro me desmanchando em vermelho Continuar a ler “POESIA de – Lua Pinkhasovna”

A ÚLTIMA CEIA COM AS ESTRELAS – por Madalena Medeiros

“The Sacrament of The Last Supper”by Salvador Dali

 

Na eternidade boreal…

Vislumbra-se rumos dissipados em névoas!
Fragrâncias fortes e inesquecíveis,
Patentes num céu boreal.
Onde vou cear e adormecer esta noite?

Volvido nos rodopios da noite boreal,
As minhas Asas esbatem-se, num
Céu turquesa e anil, reluzem
beijos eternos de seres florescentes.

Felizardos dos eternos olhos!
Sentados em estrelas, donos
De um universo escuro e eterno,
Pincelam singelas e extemporâneas vidas.

Eternidade boreal! És sobejamente,

Luz de milhares de anos,
Despertar do adormecido,
E de estrelas que cintilam
aos olhos famintos de indignos de ti!

♣♣♣

ALCANÇADA A TUA LUZ, ELA É…

Mundo invisível, leve e solto
Em que as penas, são POESIA!
Onde a alvura é daltónica
Aos olhos do Ser espiritual…

Ouvem-se Gargalhadas e correrias,
nas estradas de luz em série!
Avistam-se Campos de feno matizado,
Em telas exuberantes e infindáveis..

 

Continuar a ler “A ÚLTIMA CEIA COM AS ESTRELAS – por Madalena Medeiros”