O PAÍS ONDE OS POETAS MORREM ANTES DE NASCER – por César Afonso

 

O País Onde os Poetas Morrem Antes de Nascer

Notas contra a imobilidade do cânone e a ausência de futuro na crítica literária portuguesa.

Introdução

Portugal é uma nação de poetas. De Camões a Pessoa, de Sophia a Herberto Hélder, a história literária portuguesa consolidou-se numa galeria de nomes que moldaram o imaginário nacional e, em muitos casos, internacional. No entanto, este legado poético que orgulhosamente se cultiva é, paradoxalmente, uma das razões que poderá explicar o estagnamento da poesia contemporânea no país — não por falta de criação, mas por ausência de visibilidade. A academia, em particular, tem-se mostrado resistente à renovação crítica, preferindo estudar, reeditar e reverenciar os poetas já consagrados, enquanto negligencia, quase sistematicamente, o pulsar de novas vozes, as margens férteis da criação, os lugares onde a linguagem se reinventa.

Neste ensaio, propomos refletir sobre a responsabilidade da academia e do circuito crítico na estagnação do reconhecimento da nova poesia portuguesa. Partindo da análise de revistas literárias, projetos de investigação e estudos contemporâneos, argumentaremos que o foco exclusivo nos cânones impede a identificação e a promoção de uma poética emergente, plural e inovadora. Esta falta de renovação crítica poderá ser, aliás, uma das razões que ajuda a compreender por que motivo Portugal — país com tradição poética fortíssima — nunca viu um dos seus poetas distinguidos com o Prémio Nobel da Literatura.

Mais do que uma denúncia, este texto pretende ser um apelo: pela abertura à diferença estética, pela escuta do inédito e pelo reconhecimento de que a literatura não se faz apenas na consagração do passado, mas sobretudo na coragem de imaginar o futuro.

  1. O olhar académico centrado no passado

A crítica literária portuguesa, enraizada nos circuitos universitários e nas revistas de referência, tem revelado uma tendência persistente: a concentração quase exclusiva na análise e valorização de poetas consagrados. Embora a atenção ao cânone seja natural e, até certo ponto, necessária, o problema emerge quando essa centralidade se transforma em exclusividade. A nova poesia, que pulsa nos interstícios digitais, nas publicações marginais, nos blogs e nos coletivos independentes, raramente encontra espaço na crítica formal, nos programas universitários ou nas publicações académicas.

Ida F. Alves, no seu estudo sobre revistas de poesia contemporânea em Portugal, aponta para esta assimetria crítica, ao demonstrar que publicações como Relâmpago, Cão Celeste e Telhados de Vidro — embora fundamentais na cena literária — privilegiam quase sempre autores já estabelecidos, mantendo um circuito fechado de leitura e reconhecimento. A própria autora reconhece que, mesmo com o crescimento de formatos digitais e alternativos de circulação poética, o olhar institucional continua colado ao passado: “as revistas literárias revelam uma ação hesitante em relação à descoberta ou consagração de vozes novas, preferindo operar como veículos de reiteração do cânone.”

Este fenómeno não é apenas uma questão de preferência editorial: é um reflexo de uma cultura académica que valoriza a segurança do que já foi legitimado em vez do risco estético. A crítica torna-se, assim, mais arqueológica do que prospectiva. Em vez de escavar o futuro da literatura, dedica-se a sedimentar as glórias do passado. Esta postura é visível nos programas curriculares das universidades, onde os estudos poéticos se mantêm centrados em nomes do século XX, com escassa abertura para fenómenos pós-2000 ou para autores não representados pelas grandes editoras.

O efeito deste conservadorismo crítico é duplo: por um lado, impede a circulação de novos autores num espaço de legitimidade; por outro, limita o próprio campo de pesquisa literária, que se torna repetitivo, fechado, autorreferencial. Como escreve Charles Bernstein, “não há poesia viva sem crítica viva” — e a crítica viva, por definição, deve estar disposta a errar, a descobrir, a acolher o estranho. Sem essa abertura, a poesia portuguesa contemporânea corre o risco de permanecer num estado de invisibilidade prolongada, ainda que tecnicamente vibrante, emocionalmente intensa e intelectualmente inquieta.

  1. Margens como motor de inovação

Se a academia se fecha num olhar retrospetivo e centrado no cânone, é nas margens — geográficas, editoriais e digitais — que encontramos o verdadeiro laboratório da poesia contemporânea portuguesa. Longe das vitrines institucionais, multiplicam-se vozes que desafiam formas, reinventam a língua, interrogam o presente com uma urgência que a crítica literária tradicional parece incapaz de acolher. Estas margens não são zonas de carência: são territórios de invenção.

O projeto “Novas Poéticas de Resistência”, desenvolvido entre 2007 e 2011 pelo Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, foi pioneiro na tentativa de mapear e valorizar a criação poética situada fora dos grandes centros e das editoras estabelecidas. Dirigido por Graça Capinha, o projeto não apenas produziu antologias, como também criou arquivos multimédia e realizou encontros que revelaram a vitalidade de uma poesia feita em blogs, revistas locais, coletivos poéticos e contextos sociais alternativos. Segundo os investigadores envolvidos, a resistência não era apenas temática ou política: era formal, cultural, institucional — uma resistência à forma como se legitima e consome a poesia em Portugal.

Paralelamente, a Oficina de Poesia, também sediada na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, tem desempenhado desde 1996 um papel fundamental na criação de espaços de experimentação e partilha. Através de workshops, publicações e encontros, a Oficina propõe um modelo de prática poética que rompe com a rigidez académica e valoriza a expressão subjetiva, a oralidade e a ligação entre poesia e vida quotidiana. Mais do que formar “poetas”, forma leitores ativos, agentes críticos e criadores de comunidade.

Estas experiências revelam que, enquanto a crítica se mantém ocupada com os grandes nomes, há uma outra tradição — como lhe chamou Marjorie Perloff — em formação contínua. Trata-se de uma tradição não institucional, onde a poesia não se mede por prémios ou programas de estudo, mas pela sua capacidade de tocar, transformar e resistir. Muitas destas vozes marginais (como Ana Deus, Luís Filipe Cristóvão, Inês Dias, entre outros) têm criado obras inovadoras, com impacto em circuitos independentes, mas continuam fora dos horizontes da crítica académica.

A ausência de diálogo entre estes dois mundos — o da crítica institucional e o da criação marginal — empobrece ambos. A poesia precisa de ser lida, discutida, inserida em redes de reconhecimento; a crítica, por sua vez, precisa de se rejuvenescer, abrir-se ao desconhecido, àquilo que ainda não sabe classificar. Nas margens pulsa o novo — e é esse pulsar que faz avançar a arte.

  1. A outra tradição: caminhos teóricos para além do cânone

O conceito de “outra tradição” tem sido mobilizado por teóricos contemporâneos da poesia para nomear aquilo que se escreve fora dos eixos legitimadores tradicionais — e, por isso mesmo, o que mais intensamente desafia e renova a linguagem poética. Marjorie Perloff, uma das mais influentes vozes da crítica moderna, defende que há uma “poesia do risco” que não se inscreve nas fórmulas da lírica confessional nem nos moldes clássicos da tradição ocidental. Esta poesia, muitas vezes marginalizada, seria, segundo a autora, o verdadeiro espaço onde a literatura se reinventa.

Charles Bernstein, cofundador do movimento norte-americano da Language Poetry, vai mais longe ao afirmar que “a tradição é aquilo que se recusa a ser nomeado como tal”. Ou seja, a verdadeira tradição é sempre subversiva, descontínua, crítica da norma — e, nesse sentido, incompatível com os processos de canonização passiva que muitas academias promovem. A crítica, segundo Bernstein, deve estar atenta às formas de resistência formal: ao experimentalismo, à intertextualidade desobediente, à escrita como gesto simultaneamente político e poético.

Em Portugal, esta “outra tradição” encontra ecos nos estudos de Cristina Néry Monteiro, que se debruça sobre o papel das revistas literárias como espaços de resistência para as poetas mulheres. Ao estudar revistas como Ítaca, Palavra, Relâmpago ou DiVersos, Monteiro conclui que estas publicações funcionam não só como alternativa editorial, mas como verdadeira contra esfera crítica, onde se dá voz ao que está fora da norma: formas híbridas, poesia feminista, escrita experimental, intersecções entre arte e política. A sua análise revela como estas revistas se tornam “lugares de fala” num país onde a crítica académica ainda hesita em lidar com o que escapa à tradição masculina, urbana e centralizadora da poesia portuguesa.

Esta tradição alternativa, ainda que fragmentária e dispersa, partilha um princípio comum: a recusa da homogeneidade. A sua poética emerge do cruzamento entre linguagens, da oralidade, do corpo, da performance, da política, da margem — não como vitimização, mas como estratégia estética e epistemológica. O que está em causa não é apenas a forma como se escreve poesia, mas a forma como se concebe a própria literatura, os seus lugares de produção, circulação e legitimação.

Ignorar esta “outra tradição” não é apenas um erro crítico: é um gesto de exclusão cultural. É impedir que a literatura portuguesa dialogue com o seu tempo e com as suas múltiplas vozes. E, talvez mais gravemente, é bloquear a possibilidade de que a poesia portuguesa contemporânea se projete internacionalmente com a força transformadora que a distingue.

  1. Consequências da estagnação crítica: o Nobel ausente

Portugal, país de riquíssima tradição poética, nunca viu um dos seus poetas ser laureado com o Prémio Nobel da Literatura. A ausência torna-se ainda mais expressiva se compararmos com países de menor dimensão literária internacional, mas que souberam projetar autores contemporâneos através de redes críticas, políticas editoriais e estratégias culturais atentas ao tempo presente. A questão não é de qualidade — pois abundam, entre nós, poetas de excecional mérito —, mas de visibilidade e de renovação dos mecanismos de consagração.

A estagnação crítica, alimentada por uma academia que prefere reverenciar o passado a descobrir o presente, contribui de forma direta para esta invisibilidade. Sem crítica ousada, sem redes de internacionalização bem estruturadas, sem renovação dos cânones de leitura e estudo, a poesia portuguesa torna-se um património encerrado em si mesmo. Paradoxalmente, quanto mais se celebra a excelência do que foi, menos se promove o que está a ser. O culto dos grandes mortos torna-se uma espécie de sombra sobre os vivos.

O caso de Herberto Hélder é ilustrativo. Aclamado como o maior poeta português da segunda metade do século XX, Hélder recusou prémios e exposição mediática — mas foi, também, vítima de uma crítica que nunca soube ou quis internacionalizá-lo de modo sistemático. A sua consagração plena foi póstuma, e mesmo assim, limitada ao circuito lusófono. Já nomes como Eugénio de Andrade ou Sophia de Mello Breyner, mais traduzidos, não tiveram o apoio crítico e institucional sustentado necessário para que pudessem figurar entre os grandes candidatos a um Nobel — como aconteceu com autores espanhóis ou escandinavos, cujas academias e Estados investiram fortemente na promoção cultural.

A responsabilidade é partilhada: das instituições académicas, das editoras, das estruturas culturais do Estado. Enquanto não se construírem dispositivos de legitimação que incluam as vozes emergentes — com espaço para diversidade estética, descentralização geográfica e abertura formal — Portugal continuará a celebrar os seus poetas no interior de um espelho, sem que a sua poesia atravesse fronteiras.

O Nobel não é, por si só, um fim. Mas é um símbolo poderoso do reconhecimento de uma literatura viva, plural, atenta ao mundo. A ausência portuguesa não denuncia a falta de valor da sua poesia — denuncia, sim, a inércia de um sistema literário que falha em reconhecer e projetar o novo, o inquietante, o que está por vir.

Conclusão

A poesia portuguesa vive, hoje, um paradoxo: ao mesmo tempo que se reconhece a sua riqueza histórica e simbólica, negligencia-se o presente em que ela verdadeiramente respira. O apego institucional ao cânone, reforçado por uma academia conservadora e por estruturas culturais pouco permeáveis à inovação, bloqueia o surgimento de novas vozes no espaço de legitimidade crítica. Como consequência, aquilo que poderia ser um tempo de reinvenção poética transforma-se num ciclo de repetição e apagamento.

A ausência de um Prémio Nobel para a poesia portuguesa não é sintoma de inferioridade literária, mas antes de uma falha coletiva na forma como se escuta, se promove e se internacionaliza a criação contemporânea. A estagnação crítica, o medo do risco, os comodismos da consagração acumulada impedem a literatura de cumprir o seu papel mais nobre: o de ser espelho e vanguarda da condição humana.

É tempo de inverter este ciclo. A crítica precisa de se reaproximar da criação. A universidade deve abrir as suas portas às linguagens do agora. As instituições culturais têm de perceber que o futuro da literatura portuguesa não se constrói apenas com arquivos, mas com escuta, coragem e abertura.

Promover os novos poetas não é um ato de caridade estética — é um investimento na vitalidade da língua, no lugar de Portugal no mundo e, acima de tudo, na dignidade criativa de uma geração que escreve não para repetir o que já foi dito, mas para dizer o que ainda não teve nome.

Referências

Alves, I. F. (2019). Revistas de poesia contemporânea em Portugal: entre o cânone e a margem. Revista Portuguesa de Literatura Contemporânea, 12(3), 45–68.
Capinha, G. (Org.). (2007-2011). Novas poéticas de resistência. Centro de Estudos Sociais, Universidade de Coimbra.
Hélder, A. R. (2010). Herberto Hélder: Biografia e obra (A. Ramos Rosa, Autor). Editorial Letras.
Monteiro, C. N. (2015). Revistas literárias e a afirmação da voz dos poetas mulheres em Portugal. Revista de Estudos Literários, 8(2), 102–120.
Perloff, M. (1981). The poetics of indeterminacy: Rimbaud to Cage. Northwestern University Press.
Bernstein, C. (1998). Close listening: Poetry and the performed word. Oxford University Press.
Mexia, P. (2018). A poesia hoje: Crítica e reflexão. Lisboa: Edições Culturais.
Deus, A. (2017). Vozes da margem: Entrevistas e perspetivas na poesia contemporânea portuguesa. Revista Digital de Literatura, 4(1), 23–37.

C. A. Afonso

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César Alexandre Afonso nasceu em Vinhais, em 1962, é Licenciado em Psicologia Clínica, Psicodramatista pela Sociedade Portuguesa de Psicodrama, Especialista em Comportamento Desviante e Ciências Forenses pelas Universidades de Medicina de Lisboa e Porto. Professor Convidado do ISCSP e ISPA. É autor diversos livros de Poesia e Romance desde 1982, sócio da SPA. Sócio fundador da Academia de Letras de Trás-os-Montes, Membro da Academia de Letras e Artes de Portugal.

MUNDOS DAQUI E D´ALÉM (III). O VASO PRECIOSO MUITO VALIOSO – por Adelina Andrês

 

MUNDOS DAQUI E D´ALÉM (III). O VASO PRECIOSO MUITO VALIOSO (I)

O VASO PRECIOSO MUITO VALIOSO

(Primeira Parte)

Às vezes a Lua, lá no céu, não se vê logo porque é nova. É Lua nova não se vê. Mas está lá na sua límpida invisível transparência. Veem-se as estrelas tantas tantas longe tão longe e algumas tão mais longe e tão mais longe ainda que são só pequenos pontinhos pequeninos de luz que se sabe forte a luzir a tremeluzir a brilhar. E algumas outras são de tão mais longe ainda que só sabemos que lá estão, e pronto. Porque estão tão mais longe e mais longe ainda e ainda e ainda que só se pode é acreditar. E pronto! São como a Lua nova. Não se vê, e está lá, e acredita-se! E pronto. Continuar a ler “MUNDOS DAQUI E D´ALÉM (III). O VASO PRECIOSO MUITO VALIOSO – por Adelina Andrês”

DA VIDA QUE A MORTE OCULTA – por Artur Manso

Em memória de Eduardo Alves Ribeiro (1956-2025)

                             O justo, ainda que morra cedo, terá repouso. Velhice venerável não é longevidade, nem é medida pelo número de anos.

Liv. Sabedoria, 4: 7-8

                            Talvez um indivíduo deva considerar que a sua própria morte é o último fenómeno da natureza.

                         Stephen Crane

É comum no espaço onde me movo discutir a minha crença/fé a partir da religião judaico-cristã, onde fui educado, assumindo me mais cristão que católico, à maneira do tolerante e liberal J. J. Rousseau. Assim sendo, para que não restem dúvidas sobre o assunto que irei tratar, a vida e a morte que já desenvolvi no ensaio Breve é toda a vida. Para uma pedagogia da morte e do morrer (2021), começo com as belas palavras de Paulo, ainda em vida, mas com a morte no horizonte: “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé. Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amarem a sua vinda”. 2 Timóteo, 4:7-8. Na Apologia de Sócrates, quando o mestre ateniense procura refutar as acusações de que é alvo, na sua demanda pela verdade e justiça já tinha afirmado, também, que tal compromisso resultava das ordens que tinha recebido do Deus. Portanto na excecionalidade de muitas personalidades, a evocação de um Deus, ou deuses, como supremo ordenador daquilo que é dado à existência, é algo que se repete com frequência. A troca de ideias mais viva surge sempre em torno das questões-limite, nomeadamente a morte e como o Criador, se for esse o termo adequado, parece ser cruel ao consentir que as crianças sofram e morram e que uma boa parte das mortes precoces, caso isso seja termo adequado, envolvam seres humanos realmente bons, daqueles que acrescentam luz à luz, que têm o dom de iluminar a escuridão. Continuar a ler “DA VIDA QUE A MORTE OCULTA – por Artur Manso”

O INVISÍVEL E O ABSOLUTO EM GUERRA JUNQUEIRO – por Alexandre Teixeira Mendes

O INVISÍVEL E O ABSOLUTO EM GUERRA JUNQUEIRO

– Sobre a edição de Joaquim Domingues de Escritos Espirituais

JUNQUEIRO, GUERRA (2025) ENSAIOS ESPIRITUAIS.

Muitas são as razões que tornam compreensível a organização e edição por Joaquim Domingues de Guerra Junqueiro Ensaios Espirituais – Notas à margem de uma filosofia, 2025. Graças à compilação de escritos inéditos do autor da Velhice do Padre Eterno – que datam de 1890-1904 – e textos afins – mas congeminações esboçadas que são simultaneamente anotações provisórias ou imperfeitas – embrionárias – de significação (in) consistente – permitem-nos hoje apreender melhor o seu percurso metafísico-espiritual e em que o sagrado (“tremendum”) e o divino ou a mística – a ágape – afiguram-se como temas centrais – subjacentes – da sua doutrina. Será possível compreender a sua obra – especulativa a ajuntar à poesia e até ao fim da vida – como o corolário “plenificante” de um processo intelectual e interior (autocontraditório) – do tipo subjectivo-existencial ou procedimental heterodoxo? Parece-nos, portanto, que o seu ultravoltaireanismo ou o vítor-hugismo na sua juventude não é menos importante que o franciscanismo final vazada numa cosmovisão “orante”. Não pretendemos discutir aqui as influências culturais – como ponto de passagem – o ser-em ou estar-em – que se revestiram de carácter episódico ou ocasional e que lhe serviram de modelo para o pensamento e para a acção. A ideologia do progressismo modernizante ou conservador – republicano – liberal-democrático – não pode ser dissociado do panfletarismo discursivo-poético – arbitrário – benéfico ou maléfico – muito corrente no seu tempo – à altura da história e da imediatidade revolucionária – plásticamente presente nos seus versos – sendo necessário ou desejável questionar nessa conexão os leitmotiv – mas, antes, chamar a atenção para o discurso filosófico – em seus próprios termos – na convicção da centralidade de uma fé religiosa ou filosófica – da ética ou de um universalismo moral judaico-cristão – insistindo, por exemplo, no amor do próximo e da natureza e, portanto, na continuidade de uma atenção ao amor divino e gravitação em torno de Emanuel (que traduzido significa “Deus connosco” Mt. 1:23). Como quer que se descreva o vértice da síntese junqueiriana privilegiada – poetizada – une-se, outrossim, a um pendor religioso e espiritual – até aos seus últimos redutos – converte-se estruturalmente num hino querigmático (categórico-soteriológico) ou num dizer ou numa escrita paraclética (ver a introdução de J. Pinharanda Gomes “A Oração Cristo-Cósmica de Guerra Junqueiro”, in Guerra Junqueiro, Oração ao Pão. Oração à Luz (Lello ed., 1997). Mas na poética de Guerra Junqueiro – tão digna de substância metafísica – convivem (explicitamente) as retóricas radicais e as ideias contrárias e contraditórias. Na predileção das compulsões estético-literárias fundacionais ou consubstanciais ao anti-clericalismo – temático-epocal – cristalizadas em alguns dos seus poemas maiores – e inerente às definições doutrinais e outras fórmulas conceptuais ao modo de Renan e de toda a literatura francesa do século XIX – na paternidade das revoluções e da propaganda – mostra-se curiosamente – e se fortalece – na sua fase final – enquanto auto-exibição do absoluto – a cristologia. Continuar a ler “O INVISÍVEL E O ABSOLUTO EM GUERRA JUNQUEIRO – por Alexandre Teixeira Mendes”

Athena Revisitada IV – Ricardo Amorim Pereira

Nesta Edição,  convido-vos a reler o Editorial da Edição nº23, escrito por Ricardo Amorim Pereira. Aconteceu AQUI

A Inteligência Artificial e suas repercussões no mercado de trabalho

Um horário laboral para o século XXI

O ano de 2022 ficará para a História como tendo sido aquele em que, pela primeira vez, um sistema de inteligência artificial entra na vida quotidiana do cidadão comum. Em novembro desse ano, a empresa OpenAI lança o já famoso ChatGPT, facto acompanhado por outros serviços semelhantes, entretanto, lançados. Assim, e num ápice, a Humanidade apercebe-se do seu real estádio de desenvolvimento, provavelmente bem superior ao que se conjeturava.

Enquanto uns vão ascendendo a um céu de felicidades, esta revolução leva outros a se petrificarem com receios. Entre os principais motivos de preocupação apontados está o impacto que tais tecnologias poderão vir a causar no mercado de trabalho, havendo quem garanta que, num prazo não muito distante, uma grande percentagem das atuais profissões poderá vir, total ou parcialmente, a desaparecer. Continuar a ler “Athena Revisitada IV – Ricardo Amorim Pereira”

TRÊS POEMAS – por A. Dasilva O.

O caso português

Somos um povo
com um nó na garganta
quando pega em armas
é para se suicidar

♣♣♣

O caminho da água das pedras

Tudo começou com um amor à primeira vista
trocado entre Eva e Adão numa casa de pasto
Tasco do Paraíso numa noite de fado vadio

Abraçados entre juras de amor impossível
foram para o ninho de amor fazer o Livro
Às cinco pancadas
Numa guilhotina

♣♣♣

Um papagaio refractário

Tirei o assassino que há em mim
ao sol pendurei-o com uma corda ao pescoço
de tão contente
começou a declamar

No alto da ignorância
Sou uma criança
Lucida

♦♦♦

a. dasilva o., 1958, poeta e editor em extinção. Da vasta obra, basta destacar as publicações: Poeta bom é poeta morto-vivo, Ed. Mortas, 2020; Canção Inóspita, Eufeme, 2020; FOIOQUEUDISSE; Diários Falsos de Fernando Pessoa, Ed. Mortas, 1998; Correspondência Amorosa Entre Salazar e Marilyn Monroe, Ed. Mortas, 1997. Criou e editou várias revistas como: Arte Neo e a revista Filha da Puta. Criou e realizou em dose dupla As Conferências do Inferno; Os Encontros com o Maldito em colaboração com o grupo de teatro Contracena. Co-fundou e dirigiu a Rádio Caos onde realizou entre outros programas: A. Dasilva O. Fala ao País. Edita actualmente a revista Estúpida.

ALGUMAS NOTAS SOBRE POESIA – por Celso Gomes

Certa feita, tomando um café no Odeon na Cinelândia, comprei um opúsculo de um poeta que passou vendendo seus livros artesanais. Em casa, li o pequeno caderno de poemas: um amontoado de versos malfeitos e sem sentido, mas bastante sinceros.

Aliás, é preciso acrescentar que todo poema medíocre é extremamente sincero e que toda grande poesia possui um fundo irredutível de falsificação, de mentiras, de astúcia. Faltava ao autor saber que poesia não é ornamentar a palavra, mas subtrair dela, de espremer dela, o seu maior silêncio. Ao final do livro, perguntei-me: porque falar tanto de si mesmo se nada foi perguntado? Depois, fiquei pensando acerca dos motivos que levam um sujeito a escrever versos, publicá-los e sair pelas ruas a vendê-los. Obviamente, não cheguei a nenhuma conclusão, apenas a algumas reflexões: Continuar a ler “ALGUMAS NOTAS SOBRE POESIA – por Celso Gomes”

RESEÑA A LIVRO DE ZLATAN STIPISIC – por Claudia Vila Molina

 

Reseña crítica a

Banderas de un imperio hundido

ZASTAVE POTONULOG CARSTV

de Zlatan Stipišić (GIBONNI) 

El poemario Banderas de un imperio hundido del cantautor y poeta croata Zlatan Stipišić (GIBONNI) del año 2024 y publicado por la prestigiosa editorial puerto riqueña Isla negra está compuesto por poemas en croata, con traducciones al español e inglés. En principio, el título encierra numerosos rasgos entrelazados con la vida, Dios, la fe, el amor de pareja, la familia, entre otros; aunque, estos conceptos son vulnerables al quiebre y al rompimiento en la voz de cada poema. Continuar a ler “RESEÑA A LIVRO DE ZLATAN STIPISIC – por Claudia Vila Molina”

DE BEM COM A (SUA) MÚSICA – por Danyel Guerra

NOTA PRÉVIA

Há décadas que a vida artística de Ângela Ro Ro pairava no perigeu, cada vez mais afastada do apogeu dos anos 80 e 90. Uma década atrás, ela ainda tentava superar a a fase de quarto minguante, buscando o usufruto de um novilúnio. Todavia, este mês de setembro, sua lua se precipitou na escuridão do eclipse total. No passado dia 8, a menina rebelde da MPB não resistiu a uma infecção pulmonar. Em eclipse perpétuo não ficará, todavia, o precioso reportório registrado ao longo de 46 anos de carreira. Esse patrimônio cultural da música brasileira
prosseguirá brilhando num perene plenilúnio. Ro Ro continuará aprontando, causando escândalo para alegria, alegria de milhões de fãs.

Angela Ro Ro

 

O sândalo perfuma o machado que o golpeia
                                                  Buda.

 

“Agora, finalmente, estou feliz da vida.” Vai para uma dúzia de anos disquei um nº de fone e do outro lado do fio escutei o afável alô de uma aloprada menina do Rio. Acendendo na fala um halo verde esperança, a mina trauteou Feliz da Vida. .“Pra que fugir de ser feliz da vida” Nesse ensejo, uma lua nova parecia estar despontando no seu firmamento artístico. O regresso ao plenilúnio dos anos 70 e 80 não seria uma ideia extravagante. O esplêndido talento de intérprete continuava vigoroso. Talento que sempre soube se aliar à exímia pulsão inventiva da compositora. Desde os alvores, esse binômio se mostrou ágil na proposta de uma praxis capaz de harmonizar numa fusão melódica a MPB com as simpatias e empatias pelo jazz e pelo blues. Continuar a ler “DE BEM COM A (SUA) MÚSICA – por Danyel Guerra”

20 DE DEZEMBRO DE 1975- por Francisco Fuchs

 

Yvonne Daumerie (fevereiro de 1927)

Para Yvonne Daumerie

Retornei à Guanabara em meados de 1971, pouco antes de completar dez anos de idade, pois Alípio Ramos, o homem que se tornou meu pai, levou-me para morar com ele quando perdi minha mãe. Foi então que conheci sua esposa, Dona Yvonne, que passei a chamar de madrinha, e a mãe dela, Madame Jeanne, que viria a falecer quase nonagenária. Fui alojado no quarto junto à escada. Nele havia, a um lado, uma varanda com duas poltronas brancas de ferro e um pequeno cômodo anexo onde livros assentavam em brancas estantes de madeira; do lado oposto, dois degraus conduziam a um minúsculo lavabo. Da varanda enxergava-se um bom pedaço do Aterro e do mar, vista que foi minguando até desaparecer por completo atrás dos edifícios que o milagre econômico foi erguendo na praia do Flamengo. Continuar a ler “20 DE DEZEMBRO DE 1975- por Francisco Fuchs”

(….) A LUTA DO MRPP – por Francisco Coutinho

18 de Setembro de 1970.
- Atritos, confrontos, rupturas.
E todos aqueles que se orgulham por terem feito a luta do MRPP

O dia 18 de Setembro de 1970 – em que Vidaúl Ferreira, João Machado, Fernando Rosas e Arnaldo Matos iniciaram a reunião na qual estudaram a construção de um partido operário -, constitui a data da fundação do peculiar Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado, que em 1976 originou – a 26 de Dezembro, dia de aniversário de Mao Tsé-Tung – o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP).

Um movimento gerado sem sair do solo lusitano – composto pela EDE, por operários da margem norte do rio Tejo e pela RPAC -, em pleno combate pelo derrubamento do Estado Novo, pelo cessar da guerra nas então colónias portuguesas no continente africano e pela independência das mesmas, numa oposição permanente à corrente pró-URSS.

São muitos aqueles que, sob os pseudónimos, desenvolveram o gosto pela escrita através do “Luta Popular” – o órgão central, várias vezes multado e inclusivamente proibido.

Há quem continue na rotina do partido. Imensos são os militantes que se foram afastando dela e passando a independentes, conforme temos na nossa família. Há também os que foram aderindo a outros partidos – como o PS, o PPD/PSD e o PRD -, algo comummente condenado por sectaristas. Fernando Rosas, muitos anos depois, foi também co-fundador do BE, onde se mantém. E outros ex-membros formaram a UMLP. São diversas as acções cívicas e sociais às quais estão vinculados. A maioria, em qualquer circunstância, continua envaidecida ao partilhar numerosas e preciosas memórias (em sessões públicas, nos livros, nas revistas e nos jornais), sobre madrugadas a colar cartazes secretamente e a pintar deslumbrantes murais, que junta aos dias de forte porrada com grupos afectos ao social-fascismo e ao marcellismo / salazarismo.  E tanto que houve mais.

Talvez a história de um encantador partido seja tudo menos merecedora de sujidade. No entanto, existiu e em momentos diversos.

Foi este uma escola de mulheres e de homens – muitos inscritos, outros simpatizantes – cujas actividades passam no plano mediático (no meio dos quais podemos encontrar Adelaide Teixeira, Ana Gomes, Aurora Rodrigues, Diana Andringa, Dulce Rocha, Maria João Rodrigues, Maria José Morgado, Violante Matos, Martins Soares, João Isidro, Freire Antunes, Saldanha Sanches, João Araújo, Mega Ferreira, António Melão, Danilo Matos, Horácio Crespo, José Lamego, Vítor Ramalho). Continuar a ler “(….) A LUTA DO MRPP – por Francisco Coutinho”

A SÍNDROME DE MNEMOSINE (…….) NA ERA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL – por José Paulo Santos

Mnemosine, a deusa da memória

A SÍNDROME DE MNEMOSINE — UMA NOVA ENTIDADE PSICOLÓGICA NA ERA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Introdução

O homem é um ser que esquece.
— Paul Ricoeur

Na mitologia grega, Mnemosine, mãe das Musas, era a personificação da memória, uma força criadora e ordenadora do saber humano. Hoje, assistimos ao seu desdobramento tecnológico: a Inteligência Artificial (IA) tornou-se o novo repositório coletivo da memória humana. Mas essa exteriorização não é neutra. Ela está a transformar profundamente a forma como pensamos, sentimos, aprendemos e nos relacionamos connosco mesmos. Surge assim um novo fenómeno social emergente: a Síndrome de Mnemosine.

Trata-se de um distúrbio psicológico e cultural caracterizado pela substituição crescente da memória, do pensamento crítico e da criatividade humana por ferramentas de IA, resultando numa perda progressiva de autonomia intelectual e identidade epistémica. Este ensaio propõe a criação dessa nova entidade clínica, apoiada em investigações nas neurociências, psicologia cognitiva, filosofia da tecnologia e estudos educativos. Explora-se ainda o impacto desta síndrome nos jovens, na educação e no desenvolvimento cognitivo-emocional.

I. As Raízes Míticas e Filosóficas: Mnemosine como Fonte de Conhecimento e Identidade

Na tradição helénica, a memória não era apenas a capacidade de recordar eventos passados. Era o fundamento da identidade pessoal, da sabedoria e da cultura. Como escreveu Platão na Mênon, a alma humana teria acesso a verdades imutáveis através da anamnese, ou seja, da recordação. Esta visão sugere que a memória é um ato consciente, dinâmico e constitutivo do Eu. Continuar a ler “A SÍNDROME DE MNEMOSINE (…….) NA ERA DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL – por José Paulo Santos”

UMA NUANCE NAS NÓDOAS VIII – por Lúcio Valium

 

ESCOVA

Ia em vários anos de ofícios quando resolvi dedicar-me à construção de pequenos barcos. Mas nunca soube navegar. Embora tenha conversado algumas vezes com o diabo ele navegador batido não me transmitiu segredos. Fiquei entregue à minha papelada. Conheci muitos que incorporaram os preceitos negociais. Foram bons clientes de deus. Que hei-de fazer pergunto-me atónito. Talvez seja melhor aprender a fazer remendos. A questão é que eu ainda estava vivo. Mas tinha um certo asco a tarefas enclausuradas. Não quer dizer que fosse muito teimoso. Nunca pedi que me ensinassem piano. Também sei que fui eu quem foi embora. Havia uma certa curiosidade. E pensava no que seria um ser liberto andar à procura de conhecimento. Naquela altura eu já precisava de tempo e uma janela chegava para ouvir a noite.

Andava nestes passos mentais quando esbarro com o do 24 junto à biblioteca. Trazia livros que lhe escorregaram das mãos. Ao apanhá-los tentou esconder os títulos. Mas pude ler um título Rapsódia e Miniaturas. Convidou-me para um galão. Estava frio e era bom uma bebida quente. Fomos ao Café Cavalo Negro. Bebeu devagar e em silêncio. Depois pediu dois brandes. Ler é um ato complexo afirmou em seguida. Pense em tudo que contêm os livros. Se soubermos procurar podemos encontrar coisas preciosas. Mas a vida, a vida é o mais importante. Contudo o cérebro pede-me leitura. É um alimento um remédio. Liga linhas perdidas para fazer o assombro de uma voz. Continuámos a beber noite dento. Quando cheguei dormias com a luz acesa. Sobre a mesa de cabeceira estava o mesmo título que vi nas mãos do gajo do 24. Deitei-me e abracei-te. Ouvia-te dormir. Sentia o calor da tua pele a deliciar-me a noite. Continuar a ler “UMA NUANCE NAS NÓDOAS VIII – por Lúcio Valium”

TRÊS POEMAS INÉDITOS – por Manoel Tavares Rodrigues-Leal (1941-2016)

Um poema inédito do caderno A Noite (1967)

meus olhos doem
de rua
do conceitual sucessivo anoitecer
recuam
de dúvida ou tempo
que não muda
movimento de ser ao sabor do
quarto
emigração de forte luz
entre os dedos
apontados fixados
num braço
apenas contacto
pela noite entro
na loucura de dentro

Lx. 25/7/67
(Coligido por Luís de Barreiros Tavares) Continuar a ler “TRÊS POEMAS INÉDITOS – por Manoel Tavares Rodrigues-Leal (1941-2016)”

TECNOLOGIA, EDUCAÇÃO E DEMOCRACIA – por João Pedro Vidal

Hoje em dia, muita gente acha que sabe muito sobre o mundo e sobre as coisas só porque vê coisas nas redes sociais. É nelas que se concentra um dos maiores fluxos de comunicação e disseminação de informação, o que é fantástico, mas também aterrador. Aquele hábito de pesquisar ativamente, que se verificava nos primeiros tempos da internet, praticamente desapareceu. Em vez disso, a internet tornou-se um espaço de consumo, onde os utilizadores consomem só o que os algoritmos decidem mostrar. Muitas vezes, sem se aperceberem, cedem a autoridade sobre o que é verdadeiro ou relevante ao que aparece no ecrã. Agora, é normal as pessoas terem uma opinião, por mais disparatada que seja. Toda a gente se sente confiante para dar a sua opinião. O problema surge quando aquilo que deveria ser encarado como uma opinião pessoal e subjetiva, como um saber informal ao que os gregos chamavam doxa, é agora adotado como conhecimento rigoroso, verdadeiro e objetivo. Esta distorção séria do conhecimento ganha força numa época em que a verdade é cada vez mais relativa. Vivemos tempos em que a objetividade está a ser destruída pela tirania narcisista da subjetividade. Antigamente, as pessoas debatiam de forma racional, mas agora parece que só interessa o barulho. A opinião de um influencer parece valer mais do que a de um perito, não porque é mais verdadeira, mas porque chega a mais pessoas. Neste novo sistema, o valor de uma opinião não depende de ser coerente ou adequada à realidade, mas da capacidade dissuasora do comunicador. Continuar a ler “TECNOLOGIA, EDUCAÇÃO E DEMOCRACIA – por João Pedro Vidal”

O PROBLEMA DAS ILHAS DE CALOR URBANAS – por Ricardo Amorim Pereira

O Aumento do Albedo Urbano como Estratégia de Mitigação das Ilhas de Calor em Portugal

As cidades, enquanto espaços de concentração de população, de atividades económicas e de inovação, enfrentam um dos fenómenos ambientais mais preocupantes da atualidade: as ilhas de calor urbanas (ICU). Este termo designa a diferença térmica registada entre as áreas urbanizadas e as zonas rurais circundantes, geralmente mais frescas. Embora a urbanização traga inúmeros benefícios em termos de desenvolvimento económico e social, a sua forma de expansão e os materiais utilizados no ambiente construído acabam por gerar um desequilíbrio térmico que apresenta implicações profundas no ambiente, na saúde e no consumo energético. Continuar a ler “O PROBLEMA DAS ILHAS DE CALOR URBANAS – por Ricardo Amorim Pereira”