POESIA de – Lua Pinkhasovna

 

Espelho de Afrodite

Entre constelações, esferas rochosas, violentas estrelas mortiças e cintilantes cometas, nascer Vênus pode ser considerado uma afronta ao restante dos planetas
Pisando em trompas, ventres, ovários e vulvas e aquela mistura que poucos sabem ao certo o nome, lambuzo-me de sangue menstrual derramado nas ruas
Há polícia? O que há? Será que alguém me escuta? É claro que não, eu sou notícia corriqueira de uma realidade fantasticamente banal
O sangramento da violência não é repudiado, apenas é visto com asco aquele que mostra que sou um ser próprio, forjada em minha natureza
sem ser sexy, sendo apenas espécie
e que sinto por fora e por dentro me desmanchando em vermelho Continuar a ler “POESIA de – Lua Pinkhasovna”

A ÚLTIMA CEIA COM AS ESTRELAS – por Madalena Medeiros

“The Sacrament of The Last Supper”by Salvador Dali

 

Na eternidade boreal…

Vislumbra-se rumos dissipados em névoas!
Fragrâncias fortes e inesquecíveis,
Patentes num céu boreal.
Onde vou cear e adormecer esta noite?

Volvido nos rodopios da noite boreal,
As minhas Asas esbatem-se, num
Céu turquesa e anil, reluzem
beijos eternos de seres florescentes.

Felizardos dos eternos olhos!
Sentados em estrelas, donos
De um universo escuro e eterno,
Pincelam singelas e extemporâneas vidas.

Eternidade boreal! És sobejamente,

Luz de milhares de anos,
Despertar do adormecido,
E de estrelas que cintilam
aos olhos famintos de indignos de ti!

♣♣♣

ALCANÇADA A TUA LUZ, ELA É…

Mundo invisível, leve e solto
Em que as penas, são POESIA!
Onde a alvura é daltónica
Aos olhos do Ser espiritual…

Ouvem-se Gargalhadas e correrias,
nas estradas de luz em série!
Avistam-se Campos de feno matizado,
Em telas exuberantes e infindáveis..

 

Continuar a ler “A ÚLTIMA CEIA COM AS ESTRELAS – por Madalena Medeiros”

7 POEMAS DO CORAÇÃO (…) – por Maria Toscano

… de trevos e rosas imaculadas
by hernan pauccara

1.

há muitas palavras para mentir e apenas uma para a verdade.
no jardim das maravilhas da minha vida
jazem vários caules hercúleos,
eternamente iluminados pela seiva
interna
a correr desde o coração.
morrerei já não jovem, sei-o agora.
e do passar dos tempos sei, também agora,
que as convenções podem matar o brilho de um olhar
uma covinha no rosto
um arrepio na nuca.
só que nunca o amor será vencido.
mora em lugar altaneiro
onde poucos acedem
de onde muitos desabam
– ali
ao alcance da tal palavra pura. Continuar a ler “7 POEMAS DO CORAÇÃO (…) – por Maria Toscano”

3 POEMAS DE “AZUL INSTANTÂNEO”*- por Pedro Vale

É preciso viver sem paixões.
Mergulhar no absoluto anonimato,
Permanecer morto ou vivo até ao fim.
Aclamar o tumulto escuro e bruto.
Encenar o drama clemente e lento.
Sentir um amor ideal por anjos nebulosos.
Descobrir um novo fundo de poesia e aguardar
uma voz que nos ordene docilmente:
– Não te movas, nem te inquietes,
nem traias o que
ainda não
és.

Continuar a ler “3 POEMAS DE “AZUL INSTANTÂNEO”*- por Pedro Vale”

ARQUITECTURAS – de Ricardo Amorim Pereira

Foto de Paulo Burnay

1.

Falta paz
Não apenas a ausência da guerra
Falta faz termos paz
Nada desejarmos ou querermos mudar
Falta nos seres algum “deixa para lá”
“Tudo bem”
“Não faz mal”
Ninguém pediu para nascer mas depois tudo nos é pouco
Quando o pouco do que não pedimos
Quando nada éramos
Nos devia bastar
Contentar
Se assim fosse
Se o pouco dado ao nada que corre para o nada fosse muito
Teríamos tudo
Tudo temos porque sim
Por Deus ou pelo destino
Só nos falta a lembrança do que somos e para onde iremos
Quando nada formos e não nos acharmos
Nem mesmo a reclamar   Continuar a ler “ARQUITECTURAS – de Ricardo Amorim Pereira”

CINCO POEMAS DE MARIA TOSCANO

 

um.

nasci para aprender a ser árvore/
crescente desde o coração da terra/
voadora pelos ramos e asas /
espraiando-me entre cumes e desertos, /
montanhas mágicas serras áridas /
e mornas planícies morenas dos suis.
até desarvorar – fidelíssima e de vez – /
no amoroso corpo envolvente
do meu devoto amor , o mar.

© Maria Toscano, Novembro, Coimbra Continuar a ler “CINCO POEMAS DE MARIA TOSCANO”

DOIS POEMAS DE Cecília Barreira

 

© Karolina Grabowska

UM TEMPO DE PAZ, UM TEMPO DE GUERRA

Veio um tempo de paz
Veio um tempo de guerra
Os comboios não paravam nas estações
As geografias não coincidiam com os mapas
Os meses eram anos
E os anos eram séculos
Veio um tempo de paz
Veio um tempo de guerra
E os soldados não tinham pátria
E as munições eram do mundo inteiro
Os países alargavam-se nas fronteiras
As geografias não coincidiam com os mapas
O amor, uma saudade uma impossibilidade
Os homens e as mulheres já não choravam
As lágrimas secas de tanta pólvora
E as bocas quietas
Sem palavras
Sem gritos
Sem sons
Porque os dias eram cinzentos
E os segundos já não cabiam nos relógios
Um tempo de paz
Um tempo de guerra Continuar a ler “DOIS POEMAS DE Cecília Barreira”

PROSE AND POEMS – by Susan Pensak

Fotografia de Paulo Burnay

Is it raining yet? Is there a chance of rain? Has it rained? Is that smoke I see coming out of the chimney across the street? Is this a picture? Am I looking at something that isn’t moving outside my window? Is that rain? Is that the sound of dragons, dungeons, wildlife, air purifiers, birds, fate? What was the illness I didn’t know by name that made the man’s left eye open incompletely (the one who was begging paradoxically, using a plastic brochure stand as his lectern, like a preacher)? What was his soul affliction? (What’s mine?) Continuar a ler “PROSE AND POEMS – by Susan Pensak”

NO QUIERO VER UNA MUJER LLORAR – por José Pérez

“Mulher Chorando”, by Pablo Picasso

NO QUIERO VER UNA MUJER LLORAR

Para Polimnia Sánchez, en Nueva York

y Julia Moura Lopes, en Porto

Por impostura o condena
aberración o inocencia
pobreza o abatimiento
no quiero ver una mujer llorar

Que se derrumben las catedrales
mausoleos y grandes torres
Que se calcinen los lechos
jardines profanados
cocinas ensangrentadas
aposentos y oficinas
donde se hayan hundido sus lágrimas

Por cobardía o jerarquía
dominación o violencia
abandono o traición
no quiero ver una mujer llorar Continuar a ler “NO QUIERO VER UNA MUJER LLORAR – por José Pérez”

A NOITE E A CIDADE – por Ana Paula Lavado

 

As ruas da cidade

As ruas da cidade são inundadas de luzes indiscretas
e vozes esparsas que falam com as cassiopeias.
A noite é imensa e as luzes têm a solidão dos velhos.
Os passos são cadenciados ao ritmo de um poema,
escrito por amor, que acabou por não ter destino.
Um bêbado encosta-se ao candeeiro da esquina
e um carro pára perto da prostituta que mastiga chiclete
e puxa a meia calça já rota de tantas noites.
Uma e outra janela mostram a insónia de quem já não dorme
e um faminto revolve os sacos deixados com sobras de nada.
Já não há corpos diáfanos nem Primaveras férteis. Continuar a ler “A NOITE E A CIDADE – por Ana Paula Lavado”

SERVENTIA – por Jaime Vaz Brasil

Navio de carga Galant Lady

Uma grande rebelião
sem causa e também sem lema
não leva ninguém a nada.
  Mas serve para o poema.

Um tombo dentro da alma
no arranha-céu dos dilemas
aos outros, talvez não sirva.
  Mas serve para o poema.

Um roteiro que tropece
na escadaria do tema
talvez não sirva ao aplauso.
  Mas serve para o poema

Um barco em pleno deserto
que o braço-em-gesso não rema
não vai ao cais nem às ondas.
  Mas serve para o poema.

Uma andorinha sem asas
leva no corpo um corpo um problema
e não traz verão no bico.
  Mas serve para o poema

Tudo o que dorme esquecido
bilhete, foto ou emblema,
a muitos não tem prestança.
  Mas serve para o poema.

Cada tristeza, cada riso
o sofrimento com seus escudos
a correnteza,
o silêncio, o impreciso:
Ao poema serve tudo.

♦♦♦

Jaime Vaz Brasil  Poeta gaúcho, com 7 livros públicados e vários prêmios, dentre os quais: Açorianos, Felipe d’Oliveira e Casa de Las Americas (finalista). Atua também como compositor, tendo vários poemas musicados e interpretados por vários parceiros, dentre os quais Ricardo Freire, Flávio Brasil, Zé Alexandre Gomes, Nilton Júnior, Vitor Ramil e Pery Souza.

VENTOZELO – por Januário Esteves

Ventozelo

Era nas noites de trovoadas, quando o relâmpago
Ao sul se descarregava no esqueleto das árvores
E em transe percutíamos a glande do mistério
Vinham os animais despojar a crença do nosso sacrifício
E logo reflectíamos a posse da atmosfera circundante
De intemporal solenidade, de prosaico pragmatismo
Convertendo as relações em dependências familiares
Na consanguinidade dos gestos e das partilhas
Mordidas na mesma carne que nos sustenta
Cultivando a emancipação dos costumes
À luz da morte que nos iluminou. Continuar a ler “VENTOZELO – por Januário Esteves”

POEMAS TRADUZIDOS DE JOSÉ PÉREZ (castelhano-português)

 

“Mulher e pássaro”, by Di Cavalcanti 1973

UNA MUJER FELIZ

He buscado en mi camino una mujer feliz
con nombre de rosa
con risa de espumas
donde las horas del sufrimiento no muestren
las sangrantes espadas

Una mujer feliz a secas
una bandera blanca de palomas
junto a campanarios de oro y sábanas de seda
como si un canto infantil la entretuviera
como si un aliento de niña escapara de sus sueños

Una mujer feliz no se parece a las culebras
no tiene vena en las espinas
ni está enterrada en la tristeza de una ventana vacía Continuar a ler “POEMAS TRADUZIDOS DE JOSÉ PÉREZ (castelhano-português)”