TEXTOSTERONA: CRÉDULOS & INCRÉDULOS – por Danyel Guerra

 

Martin Luther (Martinho Lutero): “O justo viverá pela fé” (Romanos, 1:17)

TEXTOSTERONA:

 CRÉDULOS & INCRÉDULOS

 

A ninguém agrada receber ‘Parabéns p’ra você’ no dia errado. Imagine-se o milenar desconforto de Jesus, o Cristo, ao ser mimoseado com saudações de niver numa data em que historicamente não nasceu.

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Bilhões de seres humanos vivem e morrem sem superar seus dilemas metafísicos. Entretanto, milhões admitem estar no (bom) caminho ao não acreditarem num alegado deus antropomórfico, concebido à imagem e semelhança dos mentores e líderes religiosos. Têm meio caminho andado.  

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Muitas vezes, em suas pregações, Martin Luther advertiu seus seguidores. “Deixem Deus ser Deus!”  O problema é que a maioria dos fiéis, além de não acatarem a advertência, deixavam/deixam Deus ao Deus-dará. Ou, o que é bem mais intrigante, muitos deixam Deus ao Diabo-dará.

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Ao professarem suas crenças, os líderes religiosos, sendo (des)humanos, demasiado (des)humanos, arrogam o privilégio de terem, além do rei, Deus na barriga. Em vez de tê-lo no cérebro e no coração.

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Deus escreve direito por linhas tortas e até tortuosas. Em contramão, os seres humanos, demasiado humanos, escrevem torto e até tortuoso por linhas direitas. Não passamos de seres tortos, quando não tortuosos. Se ainda fossemos como o anjo torto dos poetas Carlos Drummond de Andrade e Torquato Neto…

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“(…)assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido.”, dispõe a principal oração do Cristianismo. Todavia, eu creio que só devemos perdoar quando o ofensor solicita, de modo expresso, o perdão. Pode muito bem acontecer que ele não queira ser perdoado.

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 A bondade, a tolerância, a bonomia, a caridade da esmagadora maioria dos religiosos e crédulos não resiste à provação de uma pisadela nos calos. Quando esse acidente acontece, eles nunca mais se calam.

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Inúmeros crédulos julgam que se tornam justos perante Deus (apenas) pela prática de obras de caridade.

Resgatando do desterro a sole fide de Paulo de Tarso, Martin Luther  enfatizou que “o justo viverá pela fé” (Romanos 1: 17).

“Fora da caridade não há salvação”, pregou, por seu turno, Allan Kardec.

Entendo que essas duas conclamações, sobrestimando ora  a fé ora a caridade no plano de salvação, serão um tanto inamovíveis e inflexíveis. A fórmula salvífica para superar o dilema metafísico do crédulo talvez esteja contida nesta sapiente reflexão de Bahá ‘u’lláh: “A essência da fé está na escassez de palavras e na abundância de ações”. Uma fé ativa, proativa.                                   

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Os religiosos apostrofam, em regra, o homem de pouca fé. Contudo é preferível ser um homem de pouca fé do que ser um que apouca a fé.

Um crédulo cheio de fé não é, de modo algum, um enfezado. Mas por causa da má fé de muitos, o plural dessa fé corre o risco de ser fezes.

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“O Evangelho morreu na cruz” , lavrou Nietzsche em ‘O Anticristo’. Se em verdade ressuscitou com o Cristo, não demorou a ser de novo imolado na ara do poder, da corrupção e das felonias dos líderes religiosos.

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A Acedia (Preguiça em latim) é o mais sacrílego dos pecados capitais. Por culpa dele, fica mais difícil praticar, de modo obsceno, os restantes seis.

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“A mulher aprenda em silêncio, com toda a sujeição; pois não permito à mulher que ensine, nem que tenha domínio sobre o homem”

                                Paulo de Tarso, 1 Timóteo 2: 11-12

Numerosas denominações cristãs são injustamente cobradas pelo fato de não ordenarem (as)mulheres como pastoras e sacerdotisas. Mas na verdade, todas elas, sem exceção, ordenam (as)mulheres, isto é, as põem na ordem. E, na sua maioria, até as ordenham, como se fossem cordatas ovelhas do rebanho em pastoreio.  

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“Pai meu que estás no Céu, santificado seja o meu nome, venha a mim o meu reino, seja feita a minha vontade, assim na terra como no sétimo Céu da (minha) boca”. É assim que uma parcela muito significativa dos cristãos reza a ‘Oração do Senhor-Pai Nosso’, distorcida em ‘Pai meu’.

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A família que festeja unida o Natal, já está desunida no réveillon. E a família que festeja desunida o Carnaval, fica de novo reunida no dia das Cinzas. Não tem nada igual a religião para unir e reunir o rebanho no redil.                             

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“Matem-nos todos, porque Deus saberá reconhecer seus fiéis”

            Arnaud Amalric, na cruzada contra os cátaros.

Religiosos dessa laia, não hesitam em matar para terem mais poder.

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“Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”

                              Evangelho de João, 8:32

Mas a verdade só será verdadeira, se dela própria libertar os fiéis.

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Muitos crédulos praticam a caridade por egoísmo e exibicionismo. Antes assim do que assado. Para muitos deles, as boas ações são as (bem) cotadas na Bolsa de Valores.

Todavia, até a caridade tem limites. Deus manda seus crédulos serem bons. Mas Ele não manda seus crédulos serem bobos.

Vale lembrar que a caridade é, por norma, um pretexto para se fazerem negócios obscuros e imensamente lucrativos.

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                   O meu Reino não é deste mundo.

                                        Jesus de Nazaré, Evangelho de João, 18:36

De certeza que nessa assertiva, falta um “i” antes do “m” de mundo.

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 É um caso de estudo, a recorrência, a insistência com que os líderes religiosos transtornam as manifestações teofânicas em rituais teofágicos.

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“O paraíso cristão é um digno êmulo do paraíso muçulmano”

Machado de Assis in ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas

Para ganhar nessa emulação, o cristão tem de prometer mais húris (virgens) como prêmio, do que o muçulmano. Pelo menos 73 por fiel.

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O proselitismo predatório continua sendo a cicuta servida pelas religiões.

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Embatendo de frente no muro, o veículo ficou todo escaqueirado, mas o motorista saiu ileso. No vidro traseiro podia ler-se ‘Deus está ao volante”. Ainda bem, senão imaginem o que poderia ter acontecido. 

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“Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a terra”

O autor do ‘Genesis’ (1, 28) também deveria ter alertado para as consequências nefastas do crescimento da população do planeta.

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A minha  coerência de não cristão, leva-me a ignorar o Natal. Porém, se fosse cristão, sou taxativo em garantir que continuaria ignorando o Natal.        

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“Sou ateu, graças a Deus”

Luis Buñuel

Na sua cruzada, os ateus insistem em evocar/invocar um Deus que “inexiste”. No seu afã ateísta, evocam/invocam mais Deus do que muitos teístas. “Falem que eu inexisto, mas falem de mim”, poderá Ele replicar.

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Ao cristão é pedido que dê a outra face, sempre que ofendido. Todavia, muitos só estão dispostos a dar a face  oculta da Lua.

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Nos séculos XV/XVI, os navegantes descobriram o mundo. Nos séculos seguintes, os religiosos fizeram tudo para encobrirem o imundo.  

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Tal como o Sebastião José, sempre que vejo um jesuíta, eu quero comê-lo.

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Sobre esse negócio de vida depois da morte, eu torço para que só exista o breu total. Existindo tão imensa luz, só a conta deve causar eletrochoques.

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Certa vez, perguntaram a Martin Luther. se o senhor tivesse a certeza que o mundo acabaria amanhã, o que o faria hoje? Plantaria uma árvore. Sendo uma árvore das patacas, eu posso dar uma ajudinha, Herr Luther?

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O Deus dos monoteístas tem a onipotência de policiar, julgar, penalizar.

O Deus dos deístas não veste farda de policial ou militar, nem beca de juiz.

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Ao se converterem, alguns incrédulos se tornam maus crédulos. P. e., o cristão novo Paul Claudel “enterrou” viva a irmã, Camille, num convento.

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Não tenho nada contra que as religiões controlem e policiem a vida espiritual e temporal das reses de seus rebanhos. Porém, tenho tudo contra a tentação teocrática das religiões ousarem ingerir na vida temporal de quem não é rês de seus rebanhos. Sopram um temporal tão funesto como as piores tempestades meterológicas.

Amem em vez de clamarem Amen

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Danyel Guerra nasceu na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, Brasil,  num novembrino dia de Vênus, sob o signo de Escorpião. No ano em que Lygia Fagundes Telles publicava ‘Ciranda de Pedra’, seu romance inaugural.
Editou e/ou publicou os livros ‘Em Busca da Musa Clio’ (2004), ‘Amor Città Aperta’ (2008), ‘O Céu sobre Berlin’ (2009), ‘Excitações Klimtorianas’ (2012), ‘O Apojo das Ninfas’ (2014), ‘Oito e demy’ (2015), ‘O Português do Cinemoda’ (2015), ‘Os Homens da Minha Vida’ (2017) e ‘Corpo Estranho’ (2021).

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