FILM – por Rolando Revagliati

Foto by Mathias PR Reding

Una joven dama argentina casada se halla con un mexicano licenciado en abogacía. Tienen un hijito y una mansión en ciudad de México. Ella era cancionista de tangos hasta que se produjo su enlace, sin lo que se dice amor-amor, para acceder así, legalmente (por la puerta grande, principal), a la suprema misión a la que una mujer muy mujer está destinada: dar a luz y consagrarse al retoño. Continuar a ler “FILM – por Rolando Revagliati”

DESAFIOS AMBIENTAIS PARA O SÉCULO XXI – por Ricardo Amorim Pereira

Foto de Mariana Blue

As sociedades, de uma forma crescente, vêm ficando atentas à situação delicada em que nos encontramos, no concernente à problemática do aquecimento global antropogénico. Com efeito, cada vez mais, é menor o número daqueles que prescindem de reconhecer que este se afigura como um dos principais problemas com que a Humanidade se confronta ou se confrontou. A ciência mais credível e bem estabelecida, com efeito, é perentória, ao afirmar que a atual trajetória de emissões de gases causadores do efeito de estufa está a encaminhar-nos para um desastre de dimensões bíblicas. Subsiste, todavia, uma, aparente ou não, dicotomia entre preservação ambiental e crescimento económico. Como se pudesse haver economia sem ambiente e, sem economia, possibilidade de apreciarmos e beneficiarmos de um bom meio ambiente. Tal como as Histórias políticas do século XX e do início do XXI demonstraram à saciedade, todo o tipo de fundamentalismos encaminha o ser humano para a sua perdição. Deste modo, o desafio existencial com que, atualmente, nos confrontamos só encontrará resolução, efetiva e duradoura, quando for possível harmonizar estes dois mundos – o económico e o ambiental. Continuar a ler “DESAFIOS AMBIENTAIS PARA O SÉCULO XXI – por Ricardo Amorim Pereira”

O PERISCÓPIO – por Marília Miranda Lopes

Quem tem olhos para ver pode convencer-se de que nenhum mortal consegue guardar um segredo.

Sigmund Freud

Quando a memória o obrigava, debruçava-se no próprio colo, entre os mistérios estomacais. Punha-se a cismar, na postura de ampulheta imóvel. Por dentro, bulia, como areia a cair por estreito trajecto. Talvez sentisse uma ligeira febre, um aquecimento de motor. O organismo tinha de funcionar. A maravilhosa máquina não iria decepcioná-lo, sabia-o: conhecia as manobras interiores, o mínimo alerta ácido, as sedes, as fomes, as indisposições, os enjoos, os vómitos, as temperaturas, as fricções.  Acaso seria possível voltar ao vaso inteiro de si mesmo, no âmago de uma contrariedade apertada? Continuar a ler “O PERISCÓPIO – por Marília Miranda Lopes”

CINCO POEMAS DE MARIA TOSCANO

 

um.

nasci para aprender a ser árvore/
crescente desde o coração da terra/
voadora pelos ramos e asas /
espraiando-me entre cumes e desertos, /
montanhas mágicas serras áridas /
e mornas planícies morenas dos suis.
até desarvorar – fidelíssima e de vez – /
no amoroso corpo envolvente
do meu devoto amor , o mar.

© Maria Toscano, Novembro, Coimbra Continuar a ler “CINCO POEMAS DE MARIA TOSCANO”

UM ROMANCE NAS NÓDOAS DA MISÉRIA (2) – por Lúcio Valium

 

APARELHOS

Comi no meio de um ruído imenso. Tomei dois cafés. Procuro um lugar fora do mecanismo. No futuro será mais difícil de encontrar. Cada vez haverá menos lugares desses. Atravesso as compridas artérias institucionais e fecho-me numa sala para escrever. Não há música mas podem enviar-se escritos. É uma área de organismos tecnológicos. Uma visão da vida controlada nos nossos tempos. Fórmulas dados sintomas diagnósticos perfis são palavras que saltam destes aparelhos. Tudo em gráficos e grelhas. As vidas como gravações para consulta pragmática. Nada que lembre coreografias sexuais desmesuras sem palco ou o espanto de quem se perdeu nas cidades e nas vidas de outros. Continuar a ler “UM ROMANCE NAS NÓDOAS DA MISÉRIA (2) – por Lúcio Valium”

METRO MEDIDA* – por Lua Nê

 

Vê? Que tudo virou medida. Esses números que a gente regurgitava. Que engolimos, fazendo hematomas por nós adentro. Uma semana. Que virava duas e três. Um morto que nunca era um, era nome, era gente, eram cinquenta mil. Eram cem. Cem mil nomes. Sem mil nomes. E quatrocentos mil. Mais sem. Aquela espécie de virose que medo mete. Sentir-se em contradição, o tempo todo tempo, tempo cem tempo. O que cabia num tempo não era um, era cem, era sem, juro. Tempo sem tempo dentro. Os cômodos, incômodo. Ficava. Eu medindo a aflição crescer pelos batentes da porta de um em um mês. Tanto que crescia, pegava lápis pra escrever, assim, como mãe que acompanha a mania de grama que criança tem. Minha aflição pôs-se pra mato. De um em um metro. E aquilo era auto distância. Continuar a ler “METRO MEDIDA* – por Lua Nê”

O HOMEM QUE DORMIU DEMAIS – por José D’Assunção Barros

Só fui acordar vinte anos depois! O despertador tinha me traído. Preparado para berrar às oito horas da manhã, como EM todos os dias, daquela vez o relógio resolveu ficar em silêncio durante um quinto de século. Agora, eu estava ali, duas décadas perdidas depois, olhando para aquela folhinha espetada na parede, já virado até mesmo o século. Vocês se lembram daquela história em que o personagem dormira durante vinte anos ininterruptos, para acordar em um mundo no qual a grama do seu jardim vinha lhe bater nos joelhos? Tem muita dessemelhança com a minha! Para começar, a grama do meu jardim estava cuidadosamente bem aparada. Como se alguém tivesse tido a preocupação de mantê-la, enquanto o dono dormia, em plena conformidade com a linha de austeridade exigida às vegetações urbanas e rasteiras. Dentro de casa o interruptor ainda controlava a luminosidade da sala, sinal de que a luz não havia sido cortada por falta de pagamento. No mais, estava tudo perfeito. A poeira varrida. O pó de café cheirando a ontem… como se, em nenhum instante, a rotina tivesse sido quebrada. Continuar a ler “O HOMEM QUE DORMIU DEMAIS – por José D’Assunção Barros”

MARGINÁLIA – por Januário Esteves

 

 

 

 

António Machado

Desbravando caminhos caro António Machado a vida é mais satisfatória e o corpo conserta
a alma dorida como a água que nos sacia
e o vento na cara que nos desperta o coração
comovido pela flor que desabrocha o mistério
da árvore que dá os seus frutos mansamente
ao longo das estações como eu dou ao sonho
as profundezas do meu ser envolto na memória
que se estende pelos campos em volta da infância carregada de segredos ternos e doces
na vastidão incomensurável do amor paterno
encontramos as raízes daquilo que somos
como um arbusto fulminado pelo raio
vemos para lá do tangível, para lá da parede
àquela luz que nunca se apaga, vislumbramos
as épocas de ouro e terror, o caminhar certo. Continuar a ler “MARGINÁLIA – por Januário Esteves”

TOMANDO UM KAFKAFÉ COM ELE – por Danyel Guerra

Lygia Fagundes Telles © Acervo Arquivo Nacional

 

“(…)’As glórias que vêm tarde, já vêm frias’,

  escreveu o Dirceu de Marília. Me leia enquanto estou quente”                                

 Lygia F. T. 

    TOMANDO UM KAFKAFÉ COM ELE

 

Exuberância tecida de curiosidade, Lygia entra no jardim dos caminhos que se bifurcam, dirigindo-se, sem hesitações, ao canteiro nº 40. Embevecida, captura, ávida, a fragrância da rosa imarcescível, o primoroso exemplar do borgeano jardineiro. “(…) ninguém pensou que o livro e o labirinto eram um único objeto”. Continuar a ler “TOMANDO UM KAFKAFÉ COM ELE – por Danyel Guerra”

“ESO DE AHÍ” POEMÁRIO DE MIGUEL MORENO (reseña) de Claudia Vila Molina

Sumergirnos en el espacio poético de “Eso de ahí” implica observar la poesía desde diferentes niveles que se vislumbran desde su lectura. En primer lugar, debemos destacar que los textos del poemario fueron creados entre los años 1989 y 2020, de ellos resalta el aspecto visual como parte intrínseca de la propuesta poética, luego el tópico político, punto imbricado al anterior, desde el que surgen diferentes elementos importantes a analizar. La poesía visual se ha encargado de recoger, deconstruir y traer ante nuestros ojos bajo nuevos preceptos, texturas y soportes del mundo artístico (dibujos, serigrafías, collage, fotografías) como relativos a las comunicaciones (tipografías, titulares, recortes, cartas, sellos) o a la publicidad (slogans, iconografía, estereotipos) los que constituyen fragmentos de aquella modernidad que han sido descontextualizados de sus usos comerciales para hacer ver, desde la vereda poética o artística, como el bombardeo constante de imágenes puede ser también reutilizado como material con fines estéticos. (Páez, 14) Continuar a ler ““ESO DE AHÍ” POEMÁRIO DE MIGUEL MORENO (reseña) de Claudia Vila Molina”

QUEM PORFIA MATA A CAÇA – por Celso Gomes

Entendeu o título? Pois é, essa é a primeira dificuldade entre tantas desse artigo, que visa analisar o romance O Homem Duplicado de José Saramago – único autor em língua portuguesa agraciado com o Nobel de Literatura – no qual é retratada a crise existencial de um professor de história que assistindo ao filme – cujo título é o mesmo desse artigo – subitamente, se reconhece no rosto de um ator coadjuvante, lançando-se à sua procura. Continuar a ler “QUEM PORFIA MATA A CAÇA – por Celso Gomes”

DOIS POEMAS DE Cecília Barreira

 

© Karolina Grabowska

UM TEMPO DE PAZ, UM TEMPO DE GUERRA

Veio um tempo de paz
Veio um tempo de guerra
Os comboios não paravam nas estações
As geografias não coincidiam com os mapas
Os meses eram anos
E os anos eram séculos
Veio um tempo de paz
Veio um tempo de guerra
E os soldados não tinham pátria
E as munições eram do mundo inteiro
Os países alargavam-se nas fronteiras
As geografias não coincidiam com os mapas
O amor, uma saudade uma impossibilidade
Os homens e as mulheres já não choravam
As lágrimas secas de tanta pólvora
E as bocas quietas
Sem palavras
Sem gritos
Sem sons
Porque os dias eram cinzentos
E os segundos já não cabiam nos relógios
Um tempo de paz
Um tempo de guerra Continuar a ler “DOIS POEMAS DE Cecília Barreira”

A PÁTRIA METAFÍSICA – por Cassiano Russo

Foto de Cottonbro

Emílio passava boa parte do seu dia trancado naquele quartinho de pensão. Não saia de lá por horas. Preenchia seu tempo escrevendo. Dizia ele que a única coisa que dava sentido ao vazio de sua existência era a escrita, que lhe funcionava como “exílio metafísico”. Para ele, o mundo lá fora não passava de um deserto de nulidades ontológicas. O escritor solitário via a maioria dos seres como “hipocrisias existenciais” que nada tinham a lhe acrescentar. Com essa sua convicção, o contato que ele mantinha com as pessoas era escasso. Saía somente aos sábados para tomar um drink em um café na avenida central da cidade. Lá ele se reunia com o seu único amigo, um anacoreta depressivo que não encontrava razão alguma para existir, pois a vida lhe era demasiado diáfana. Continuar a ler “A PÁTRIA METAFÍSICA – por Cassiano Russo”

REFLECTIONS OF A STRANDED NOMAD – por Alexandra M.

Fire and Ice (South India, January 2020)

A dramatic title for the description of two mundane things. Winter in the tropics. Winter in Portugal. And yet so accurate. The temperature around me dictates my mood much more than I would like to allow. Give me sun and heat and I will be happy and pleasant. Give me cold and grey and I am too uncomfortable to be nice. Luckily I was born in one of the sunniest countries in the world so there the combination of both, cold and grey, is rare. Which doesn’t stop me from fleeing to warmer latitudes as much as possible. Continuar a ler “REFLECTIONS OF A STRANDED NOMAD – por Alexandra M.”

EDITORIAL- MAMÃE EU QUERO CARNÁ – por Danyel Guerra

‘A Marcha dos Caretos’, de Balbina Mendes

 MAMÃE EU QUERO, MAMÃE EU QUERO CARNÁ

 Mó num pa tropi / Abençoá por Dê/ E boni por naturê/
Mas que  Belê/
Em feverê (em feverê) Tem Carná (tem Carná)

Jorge Ben Jo

1) Tudo Ben, Seu Jorge, mas este feverê não  tem Carná totalmente livre e irrestrito. Pelo segundo ano consecutivo, Momo não está podendo cair na gandaia do jeito que o diabo gosta. Continuar a ler “EDITORIAL- MAMÃE EU QUERO CARNÁ – por Danyel Guerra”

O AMOR PLATÓNICO: Fragmento a Propósito de um Equívoco – por A. Sarmento Manso

Foto by Paulo Burnay

Platão é um grande exegeta do amor, tratando-o de forma única, deixando um lastro de desejo e luxúria que perdura até à atualidade em qualquer das suas manifestações: homossexual, heterossexual, bissexual, espiritual. No entanto dessa herança ressalta de boca em boca uma ambiguidade em torno daquilo que passou a designar-se de amor platónico expressão cunhada por Marsílio Ficino (1433-1499). Os estudiosos mais atentos vão enunciando o seu verdadeiro significado, mas raramente, nesse pormenor, saem do enredo em que a tradição o confinou. Platão nos diálogos O banquete e Fedro trata do amor físico e metafísico, abrangendo em simultâneo o corpo e a alma, a carne e o espírito, a sedução e a contemplação. Continuar a ler “O AMOR PLATÓNICO: Fragmento a Propósito de um Equívoco – por A. Sarmento Manso”

O QUARTO – por Cassiano Russo

                                                                                                          Foto byTima Miroshnishenco

Uma fumaça com cheiro de enxofre começava a sair do quarto do subsolo daquela velha pensão situada na Vila Mariana. Lá dentro estava um homem a registar seu diário. Os transeuntes que passavam por perto do imóvel, assustados, decidiram chamar os bombeiros. Continuar a ler “O QUARTO – por Cassiano Russo”

CONSIDERAÇÕES SOBRE O LIBERALISMO DE HELENA ROSENBLATT- por Cecília Barreira

 

É importante tecer algumas considerações acerca da obra de Helena Rosenblatt, A História Esquecida do Liberalismo, publicada e traduzida pelas Edições 70 em finais de 2021.

Professora de História na Universidade de Nova Iorque, a autora referencia como o termo liberal no contexto político dos EUA, é mais consensual que o termo democrata. Continuar a ler “CONSIDERAÇÕES SOBRE O LIBERALISMO DE HELENA ROSENBLATT- por Cecília Barreira”

MULHERES NAS RUAS DO PORTO – XIX- por César Santos Silva

Cecília Meireles (Rua de)
Início:  Falcão (Rua do)
Fim: Camilo Pessanha (Rua de)
Designação desde 1971

Freguesia de Campanhã

Uma das mais consagradas poetisas bra­sileiras do século xx, Cecília Benevides de Carvalho Meireles nasceu no Rio de Janeiro em 7 de Novembro de 1901. Órfã de pai e mãe, neta e filha de açorianos, facto que viria a ter influên­cia na sua formação enquanto escritora, dado a sua avó lhe contar imensas histórias que aprendeu nos Açores. Continuar a ler “MULHERES NAS RUAS DO PORTO – XIX- por César Santos Silva”

PRESENCIA DE SÍMBOLOS RELIGIOSOS EN EL IMAGINARIO DE ALTAZOR- por Claudia Vila Molina

 

En el presente ensayo se analizarán diferentes elementos expuestos en el prefacio del texto Altazor. Un primer aspecto que llama la atención es la reunión de símbolos extraídos desde la tradición judeocristiana (Cristo, Dios, la Virgen, el demonio), en relación con ello se presentarán diversos argumentos. Continuar a ler “PRESENCIA DE SÍMBOLOS RELIGIOSOS EN EL IMAGINARIO DE ALTAZOR- por Claudia Vila Molina”