Krzysztof estava atordoado. Não entendia porque Jadwiga ainda lhe delegava aquelas tarefas aparentemente fáceis, como comprar no mercado um Baranek Wielkanocny. Poucas coisas ainda eram fáceis para Krzysztof, mas Jadwiga parecia não entender ou não aceitar que assim fosse. Seu homem podia ser simples e até podia, àquela altura da vida, estar um pouco confuso, mas já havia construído mais casas do que era capaz de contar, abrigando dos rigores do inverno velhos e moços, letrados e iletrados, católicos e ateus; e mesmo sem ter jamais conhecido essas gentes, rezava diariamente para que vivessem em harmonia, pois, na sua visão, apenas assim poderia considerar completo seu trabalho.
Havia, no mercado, muitos Baranki Wielkanocne. Em verdade, distribuídos ao longo de várias prateleiras, havia uma enorme variedade de cordeirinhos de açúcar; todos, porém, pareciam sorrir-lhe. Aquilo não estava certo. Sentia-se a ponto de desfalecer, tamanha foi a vertigem que adentrou seu coração. Quase em desespero, pediu ajuda a uma cliente que vagava pelos corredores do mercado.
— Senhora! Senhora! Preciso de ajuda!
— Pois não?
— Senhora, minha esposa pediu-me que comprasse um Baranek Wielkanocny…
— Sim?
— Mas eu preciso encontrar um que não esteja sorrindo! Como posso celebrar a Páscoa com um cordeiro a sorrir? Como pode o crucificado sorrir? Não posso! É um pecado!
Krzysztof brandia na mão, ao dizer essas palavras, o mais simples, o mais pobre entre todos os cordeiros de açúcar, cujos olhos eram representados por dois pontos pequeninos, e o nariz, por um pequeno traço curvo. Mas esse traço, apesar de posicionado no lugar do nariz, lembrava uma boca, e uma boca que sorria.
Embora fosse estrangeira, a jovem senhora entendera perfeitamente as palavras de Krzysztof; entretanto, e ainda que sorrisse o tempo todo, não estava disposta a ajudar um cavalheiro tão singelamente vestido. Decerto que seu catecismo rudimentar não lhe teria permitido formular todo um argumento teológico que aplacasse o drama daquele senhor: pois se o cordeiro pascal representava a vitória da vida sobre a morte, mal não havia que ostentasse um discreto sorriso. Mas teria sido muito fácil, em compensação, fazê-lo compreender que a suposta boca do borrego não passava de um nariz; e ainda que não soubesse dizer essa palavra em polonês, poderia ter feito gestos apontando para o nariz do cordeiro e para o seu próprio, fazendo o velho senhor perceber que aquele animalzinho de açúcar possuía dois olhos e um nariz, mas não uma boca, e que, posto que não possuísse boca, não podia estar a sorrir.
Semelhante tarefa, no entanto, pareceu-lhe exigir imenso trabalho. Para ela, o pequeno carneiro portando um estandarte vermelho não significava absolutamente nada, e o pobre velho não passava de um simplório preocupado com bobagens. Por que haveria de ajudá-lo? Por que haveria de importar-se com a angústia de um disparatado que implicou com o falso sorriso de um cordeirinho de açúcar? Acaso estariam eles numa igreja? Ou estariam num mercado, onde a única preocupação aceitável era a de abarrotar o carrinho de compras e economizar tantos cêntimos quanto pudessem?
Krzysztof voltou para casa de mãos vazias, triste e indignado, porém Jadwiga confortou seu coração ao moldar e pintar, ela mesma, um Baranek Wielkanocny suficientemente austero.
A jovem senhora, por sua vez, sentiu-se vitoriosa, sabe-se lá por que razão, e resolveu selar seu triunfo levando para casa o doce que o velho havia recusado. Ao saborear seu troféu, todavia, sentiu um travo inesperado; havia no petisco um quê amargo cujo gosto permaneceu em sua boca bem mais tempo do que seria de se esperar.
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Francisco Traverso Fuchs descobriu que o tabaco não torna em fumaça as mágoas, e trocou-o pelo chimarrão. No entanto, devido aos muitos anos de tabagismo, sofre de lapsos de memória relativos à mais recente reforma ortográfica. Ousou traduzir As Leis Sociais, de Gabriel Tarde, foi expurgado e descobriu por que claudica o Brasil. É mestre em filosofia pela UFRJ, mas prometeu roubar o fogo e tornar-se filósofo.
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