DALI E A “TENTAÇÃO DE SANTO ANTÃO” – por Rosa Sampaio Torres

Dali e seu quadro “Tentação de Santo Antão”

 

Uma experiência de viagem especialmente marcante para mim foram visitas às casas que o pintor Salvador Dali possuiu próximo de Barcelona: seu museu em Figureis, a casa de praia em Port Lligat, e o “castelo” de Pujol do sec. XI comprado para sua mulher. Gala – por ele próprio restaurado e decorado.

Quando visitei este seu amoroso presente para Gala na localidade de “La Pera”, surpreendi-me a chegada pelas majestosas roseiras cor-de-rosa plantadas pelo próprio Dali, que subiam pelas antigas paredes de pedra da casa – rosas enormes, ainda muito bem cuidadas pelos funcionários.

Porém, o meu maior deslumbramento aconteceu na sala de entrada da residência – surpreendida por seu quadro “Tentação de Santo Antão” – Santo Antão descrito na lenda como tendo resistido às tentações da carne, da riqueza ou de poder. Não sei se esta grande tela seria ainda a original do pintor, que hoje estaria na Espanha. Mas provavelmente com esta pintura Dali tentara acalmar Gala – ela sofrendo de uma crônica insegurança financeira, sua biografia registrando que no passado ela havia deixado a Rússia revolucionária, e seu primeiro marido cedo havia empobrecido.

Temos que as tentações de Santo Antão constituem, igualmente, o tema de uma outra pintura célebre – um trítico do famoso pintor Hieronymus Bosch (14951500), que se encontra hoje no Museu Nacional de Arte Antiga, em Portugal. Assim, Dali se inspira em Bosh não só pelo tema da tentação de Santo Antão, também pelos elementos pictóricos e simbólicos que ele repete em seus próprios quadros – como o peixe devorador, o ovo, ou animais voadores de pernas frágeis – temas de Boch que serviram de inspiração para Dali.

O “castillo” comprado e ornado para Gala, pleno de simbolismos, fora para ela um hino de amor – aquela que o havia incentivado e, ele sabia, o havia salvado de suas inibições sexuais e “stress” psicológico da juventude.  Nos jardins da casa, ainda várias esculturas de elefantes elevados, símbolos de poder, mas também  de extrema fragilidade que nos enternecem.

Nestes jardins senti plenamente que a obra de Dali fora, na sua maior parte, uma devoção a este amor por Gala.

Já separados, ao fim da vida Dali voltou a morar nesta casa onde Gala fora sepultada – e onde ele pretendia também ser enterrado.

Painel esquerdo do trítico de Bosch onde aparecem as imagens do ovo e animais de patas longas. À esquerda, no meio do quadro um peixe vermelho devorador, ainda quase igual ao que aparece na obra de Dali, “O sonho”.

 

“O Sonho” de Dali

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Rosa Sampaio Torres nascida no Rio de Janeiro é historiadoa, poeta e artista plástica. Atualmente apresenta seus trabalhos de Historia no blog http://rosasampaio torres.blogspot.com/ e artigos ligados às artes plásticas na revista eletrônica ConTexto, endereço https://revistacontextoarteshistgeneal.blogspot.com/

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