POEMINHOS (91-100) – por Jaime Vaz Brasil

91.

O sabor não mora
na língua ou na fruta.

Nasce na hora
em que as duas

na gruta viva da boca
se encontram.

Nuas.

92.

O artista
transforma o trivial
em transcendente.

O outro, imita
      disfarçadamente.

93.

Pai e mãe:
pais.

Tio e tia:
tios.

Primo e primo:
primos.

Irmão e irmã:
irmãos.

Todos os plurais
masculinos.

Porém
avô e avó:
avós.

Plural feminino
coração em outro estado:

amor de mãe
ao quadrado…

94.

No tempo
o passado se desfoca
em óculos opacos

esquecidos
na paciência das orelhas.

95.

Clássico
é um livro
ressentido:

muito falado
pouco lido.

96.

Bem informados são aqueles que só
buscaram as notícias
na mesma fonte que nós.

97.

História
sempre é relato.

Relato
sempre é versão.

Versão
é sempre o pedaço

de uma verdade
      em questão.

98.

Sem discussão:
quem concorda comigo
      tem razão.

99.

Nada é tão radical
quanto um ponto final:

viver está mais
      pra reticências…

100.

Muito
do que se lê

é roupa nova
     no clichê.

♦♦♦

Jaime Vaz Brasil – Poeta gaúcho, com 7 livros publicados e vários prémios, dentre os quais: Açorianos, Felipe d’Oliveira e Casa de Las Americas (finalista). Atua também como compositor, tendo vários poemas musicados e interpretados por vários parceiros, dentre os quais Ricardo Freire, Flávio Brasil, Zé Alexandre Gomes, Nilton Júnior, Vitor Ramil e Pery Souza.