Peixes
Quando os vorazes famintos atacaram a pacifica comunidade,
tirando-lhes o seu lugar de viver e relegaram as pessoas
para os subúrbios onde ninguém se conhece e cumprimenta
veio transcendente uma alucinante ideia de transformar
casas em plataformas temporais que os levariam a paraísos
artificias num lugar distante como uma bolha cósmica
que os transportasse para um alinhamento aparente
em que se viam a si próprios rodeados de simbioses
platónicas de afirmação social numa espécie de elevador
sensorial criado a partir de lembranças intemporais da infância
assumindo formas de animais nossos companheiros, nascidos
do ovo vernal da húmida matéria, saídos do beijo cloacal
perpetuando o prazer e alegria na espuma dos dias férteis
embriagados de néctar divino, eles dão-se à volúpia dos corpos.
♣♣♣
Leo
Ela adorava seu gatinho que a tinha escravizado num
ronronar de caricias e esfregões que lhe eriçavam os pelos das pernas
e a mantinha como refém de emoções viciantes de anfetaminas
criando-lhe uma sensação de bem estar e euforia que se focaliza
numa metástase que encalha e se transfere de lugar na corrente
sanguínea proporcional por uma única singularidade
a da comunicação com a lente gravitacional que oculta
um chorrilho de leõezinhos galácticos que alugou
sentimentos de pai, mãe e amigos para que a vida tivesse
algum sentido na diáspora mental das emoções circunvizinhas
dos apelos vindos da infância numa urbana selva enigmática
obscurecida pelas vozes gritantes do céu metálico
amordaçando aforismos platónicos com as ideias
que perpassam luminosas na oculta mente deslumbrada.
♣♣♣
Pegasus
Quando chega a Primavera e o vento alado traz com ele
as sementes da vida e a ousadia do prenuncio da criação
a maravilhosa sublimação de matrizes que se curam
numa dança cósmica providenciada na atração dos contrários
relampejava junto à fonte de Pirene, quando na seca
ofereciam bolos de mel aos adivinhos das transações
ousadas que se repercutem em espiritualizar o dia
das metáforas desestabilizadoras da ignorância a meias
como o absurdo de cortar a cabeça de uma minhoca
e ela crescerá uma nova, regenerando-se por si só
ou esfregando o recto dos surfistas para criar antibióticos~
com agua do mar criando superbactérias que eliminem
doenças degenerativas por engenharia neuro fórmica
pelo cérebro aprimorado pelos raios da cabeça-olho.
♣♣♣
Gémeos
Eram filhos de pais diferentes mas tinham o mesmo feitio
ora indolentes e caprichosos, ora versáteis e vigorosos
viviam numa espécie de limbo congénito desde a infância
em que foram surpreendidos por luzes que vinham do céu
e começavam a bater-se como se tivessem numa terrível batalha
ficando com o corpo marcado, visivelmente electrocutados
e as luzes iam e vinham silenciosas ora rápidas, depois estáticas
cavando sobre a casa ruídos sibilinos de gravitação espectral
ficando os irmãos em aparatosa suspensão rodando sobre si
numa escarpa fugidia de aceleração gravítica , nus
na forma como se reconheciam disfuncionais e violentos
lambidos por uma estranha excrescência que emitiam
quando separados da sua irmandade binária coagulavam-se
numa espécie de tecido único que os mantinha seguros
sendo por isso levados por uma luz nebulosa numa viagem
sem volta, partiram para Pólux para as manhãs azuladas de Thestias.
♦♦♦
Januário Esteves usa o pseudónimo “Januanto”. Nasceu em Coruche, Portugal (1960). Escreve poesia desde os 16 anos. Em 1987 publicou no Jornal de Letras e participou ao longo dos anos em algumas publicações colectivas. Publicou na revista brasileira Musa Rara, na revista americana EIGHTEENSEVENTY .POETRY.BLOG., na Revista Brasileira LiteraLivre, na revista romena Poesis, na revista australiana Otoliths, na revista americana BlazeVox, na revista americana Harbinger Asylum, na revista americana Ducor Review, na revista indiana Taj Mahal.
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