A POESIA DE Cecília Barreira

Poema de amor fusiforme

198 ANOS DO NASCIMENTO DE BAUDELAIRE A 9 DE ABRIL DE 1821

“Je suis comme  le roi d´un  pays pluvieux,
Riche, mais impuissant, jeune et pourtant très vieux”

Ampliou-se há 198 anos em Paris na rue Hautefeuille, 13,
Rutilâncias em breves liceus,
Em vidas dissolutas, nos absurdos de ameaças sangue, sonhos em borboleta, inegável a estadia dos deuses,
Em 1839 amou em para-brisas Jeanne Duval, de vícios contados e maturados,
Tanta paixão nesses ritmos andantes de corpos feitiço e desbastados,
(foi um Poeta tão amplo que um ensaísta conjugou um trabalho notável sobre Le Siècle de Baudelaire em 2014 e outros tantos o dimensionaram e  rasuram )
O ópio e o álcool, brisas de navegação nas noites em estremunhado pêndulo,
Contraiu sífilis com a prostituta Sarah la Louchette por ronda de 1840,
Anémonas,
As faces da morte,
Tentou suicidar-se a 30 de junho de 1845,
(voltas nas madrugadas de desespero e açúcar, diálogo das cercanias)
Les Fleurs du Mal de 1857 foram perseguidas em condenações de poderes nas pinhas de cerebelos agastados,
(as igrejas nas catacumbas)
O poder político,
Estradas de regras em ruído,
A moral e o pecado em alucinação,
Les Paradis  Artificiels em 1860,
O Poeta morreu a 31 de agosto de 1867, com 46 anos , padecendo da sífilis atormentante,
Le Spleen de Paris, póstumo em glória,
Combateu o realismo em Arte e é considerado fundamental na criação e habilidade da Modernidade literária,
Transgressão e sublime corda de uma escrita espaço amplitude,
O amor, o ódio, a morte, o pecado, a luxúria, a beleza tanta, a miséria, a cumplicidade da solidão e da queda nos absurdos e na inesgotável sede de uma qualquer droga aliciante e efémera,
O Mal, a transversalidade do mal em distensão da vida e das dimensões de destinos trágicos,
O Diabo, os condenados,
Os suicidas, os loucos,
A crueldade e os valores dos malditos,
Os livros proibidos de sempre.

♣♣♣

ANTERO QUE FARIAS 177 ANOS AMANHÃ, 18 DE ABRIL

“Poder viver em todas as idades;
Poder andar por todos os caminhos;
Indiferente ao bem e às falsidades,
Confundindo chacais e passarinhos “.

Nasceste na maioridade da Poesia e da Filosofia,
Nasceste nas administrações excelsas das palavras rumo,
Bipolar e pessimista, reunias as aventuras para um suicídio de arredores,

Joel Serrão, que este ano completaria 100 anos, tanto te estudou e reverenciou,
Em Portugal perante a Revolução de Espanha, folheto juvenil e febre, sonhaste com a União Ibérica, rasgância de um iberismo possivelmente republicano,
Pi y Margall e Espanha nas crises das revoluções,
Uma Europa questionante,
A Comuna de Paris,
Bismarck,
III República em França,
Encarnados os esforços,
Marx voava,
Tu não aderias a Marx,
Amavas Proudhon,
Em Portugal nos anos setenta de oitocentos as monarquias eram ameaçadas por reivindicações,

♣♣♣

BYRON QUE MORRESTE NUM DIA 19 DE ABRIL, FAZ AMANHÃ 195 ANOS

“I must just observe, that the village of Cintra in Estramadura is the most beautiful, perhaps, in the world”.

Nasceu em 1788 em Londres, filho de um capitão e de uma herdeira escocesa, fortuna dissipada,

Em 1798 torna-se barão de Rochdale e educado no célebre Trinity College em Cambridge,

Em 1809 rumou durante 2 anos a Espanha, Portugal, Grécia, Malta, Albânia, Médio Oriente,

Surgem dessa confluência Hints from Horace e dois cantos de Childe Harold´s Pilgrimage,

O herói de Byron emerge em popularidade,

Sintra é descrita na sua beleza única, mas os portugueses não escapam a uma crítica mordaz,

A obra prima de Byron é destarte Don Juan, rasgada entre 1818 e a morte do poeta, 1824,

Em 17 cantos épicos, submersos numa sexualidade irrupção e masculinidade aberta em escândalo,

Inspirado em Tirso de Molina em 1630, Molière em 1665,

O mito do homem cuja atração pelas mulheres é a envergadura dos apetites milenares,

O sonho contado de um jovem que se encontra disfarçado de mulher, num harém pleno de lindíssimas servas de um sultão,

Os erotismos no plasma de fantasias loucas,

Tradição pícara das sociedades trilhadas pela hipocrisia,

De certeza Byron leu Don Quixote de Cervantes e Orlando Furioso de Ariosto,

Don Juan de Byron vai acumulando situações de amor, guerra, erotismos, imoralidades das chamas,

O outro lado de Fausto,

A satisfação das sensualidades interditas,

O antimoralismo em circunstância,

Os fantasmáticos sintomas de ilusões,

Poema épico e satírico dedicado ao poeta da moda de então, Robert Southey, laureado na época,

O qual odiaria a poesia de Byron,

Shelley tanto que gostou de cada verso que o secundou de imortal,

Don Juan e a conflitualidade nas aberturas,

A consagração da volúpia,

Faunos em  frenesim,

Intensidades desmedidas.

♣♣♣

PAUL CELAN

“Le poème peut être une boiteille jetée a la mer, abandonnée à l espoir-certes solvente fragile- qu elle pourra un jour, quelque part, être recueillie sur ma plage, sur la plage du coeur peut être”

A obscuridade da poesia, apreensão de um fazer a palavra poética,
O poema como trilho para uma filosofia da refração, dos idiomas em tradução autêntica,
Essa mulher que amaldiçoou Celan com o plágio nunca feito levou-o ao suicídio nas margens do sena,
A tradução em amnistia de lugares,
Após o suicídio Celan foi sendo objeto de estudos e reflexões,
O entrosamento entre poesia e filosofia nas entrelinhas,
Veracidade ou não veracidade pouco importa,
Irredutibilidade, insistência, expetativa,
A singularidade da poesia,
O ato de fazer a palavra,
O trabalho do poético,
Irresolúvel,
Dimensões de alteridades,
Trágico o destino brilhante de Celan que se lança para a morte em agonia,
Nasceu na Ucrânia, rumou a Viena de Áustria, depois Paris,
Soube o que era a condição de judeu,
Soube do nazismo, soube do sovietismo,
Soube fugir, apesar de o terem aprisionado tanto tempo,
Soube sofrer, soube ousar, soube pensar,
Hoje ele é a eternidade.

♣♣♣

POEMA PRIMORDIAL

Neste texto de infância e morte nos regressos do teu olhar,
Nestes versos de antinomia, realeza do fulgor, mar e cheiro de nenhures,
A floresta do desejo, a remanescência da linha em música de câmara,
O caderno de encargos das intimidades nunca oferecidas nem embrenhadas,
Estudado o ritmo de outrora, nos alpendres,
Finalizado o ritual de oferendas,
Um sorriso de sapato em vinhais,
Uma mão aberta na interrogação da vida,
Braços em tentativa,
Um beijo fundeado numa memória tão antiga.

♣♣♣

SARTRE QUE MORRESTE HÁ 39 ANOS A 15 DE ABRIL, NUM MESMO DIA 15 DE ABRIL EM QUE LEONARDO DA VINCI NASCEU. TU EM 1980, ELE EM 1452. OS GÉNIOS VOAM MAIS ALTO.

As palavras já não residem nas historicidades em desalinho, mas procuram-se em mitos refundadores e alheios ao sagrado, maré ontológica de um nada em emergência, um caos de transitoriedades em abstinência,

Sartre cruza-se com Simone de Beauvoir em 1929 através de René Maheu, persistências anódinas em cerejas sem Verão,

Inúteis as cadências,

Em 1932 Sartre leu Céline,

Entre 1933 e 1934 revigorou-se em Heidegger,

1938 o primeiro romance ensaio, La Nausée, na Gallimard,

Neste romance, uma bomba de alimentos em sangue, memória e rasura infiel de procura, Sartre pondera a vida de Antoine Roquentin professor de História, hospedado numa cidade imaginária portuária e setentrional, que se inicia na náusea em absoluto nas rotinas até na comida que ingere absurdidade de envolvências,

Em 1941 colabora em ambiguidades rancorosas na revista Comoedia, colaboracionista na França de Vichy,

Os inimigos à solta rasgando o génio,

Em 1943 a célebre peça Les Mouches e o ensaio L´Être et le Néant, leituras de Heidegger,

Em 1945, após a libertação de Paris, para a elaboração de artigos no Jornal Le Figaro, ruma aos Estados Unidos em apoteose emblemática,

Nesse mesmo ano funda Les Temps Modernes com Beauvoir, Merleau-Ponty , Raymond Aron, entre outros,

O gritante L´Existentialisme est un humanisme, ( esfusiante esse ano 1945,)lançou-o para a posteridade,

(Saint-Germain-des-Prés, o bairro parisiense sartriano em demanda louca)

Em 1946 aplaude e reafirma a condição judaica e forja uma crítica ao antissemitismo envolvente,

Em 1948 meneia a introdução à poesia de Léopold Senghor, mítico ditador do Senegal posteriormente,

1952 encontra-o em ação com o Partido Comunista em França, radar de militância errática,

1956 e Sartre foge dos comunistas por causa de Budapeste, demarcação histórica decote de epifanias,

1964 e renega o Nobel a ele atribuído, renega e a obscura amálgama de famas reunidas em melancolia, explode no mundo ocidental, nunca alguém tinha dito não a um Nobel,

Não aceitou um prémio de Légion d´honneur nem uma cátedra no Collège de France, outras prioridades de distâncias inacabadas, destarte o sonho,

Apoiou Cuba, mas em 1968 condenou os soviéticos que esmagaram a primavera de Praga,

Já mais para o fim da sua vida, e reconhecendo sempre o estado de Israel, denuncia as condições humilhantes em que viviam os palestinianos,

(um olhar de lucidez nas cegueiras coletivas)

A favor dos dissidentes soviéticos, manifestos e petições em 1977 onde se cruza com Foucault, Deleuze, tantos,

Em 1979, em agonia corpórea e muito  doente, apoia a glória   do aiatola Khomeini no Irão,

A amizade com Camus durante os anos quarenta e início de 50, apagou-se com uma indelével suspeita em icónica e controversa troca de artigos,

Camus publicara O Homem Revoltado em 1951 e a partir desse ponto designam-se  arquétipos diferenciados de habilidades em conceitos ontológicos, maestros,

Sartre numa contingência para-si, em-si-para-si,eu existo no meu corpo, o meu corpo é conhecido pelo Outro,  existo em mim e para mim conhecido pelo Outro enquanto corpo,

Introito de um sucumbir à liberdade ontológica sem Deus,
Camus com a apologia das não divinizações do Homem,
(que ele supusera em Sartre)
O sagrado e as figurações,
Interditos,
Coleções,
Sartre é o trilho de uma esmagada condição de existência.

♦♦♦

Cecília Barreira é Professora de Cultura Portuguesa Contemporânea na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.  É investigadora integrada do CHAM-Centro de Humanidades. Publicou na Cordão de Leitura os livros de Poesia, Desvarios e Erros Meus (2018) e Voando Sobre um Ninho Fêmeo (fev. de 2019). Iniciou a sua atividade poética em 1984 com o livro Lua Lenta (Europress). É ensaísta e, de momento, cruza a História da Cultura com a Filosofia e a Literatura nos séculos XIX e XX.