AMORIM DE CARVALHO EVOCAÇÃO DA VIDA E OBRA – por Artur Manso

AMORIM DE CARVALHO
  EVOCAÇÃO DA SUA VIDA E OBRA 
  NOS CENTO E VINTE ANOS DO NASCIMENTO  

No presente ano de 2024, comemoram-se 120 anos do nascimento de Amorim de Carvalho (Porto, 1904-Paris, 1976), distinto intelectual que Portugal conheceu no século XX, tendo-se afirmado como poeta, ensaísta, crítico e filósofo.

Autodidata multifacetado que adquiriu um vasto saber e uma sólida cultura, obtendo o doutoramento em Filosofia na prestigiada Sorbonne com a tese De la connaissance en général à la connaissance esthétique, tendo Étienne Souriau (1892-1979) e Mikel Dufrénne (1910-1995), eminentes e prestigiados estetas que o século XX conheceu, estado no júri que lhe avaliou as provas.

Amorim de Carvalho, quis aplicar o método científico quer ao mundo objetivo quer ao mundo subjetivo, porque ambos se lhe apresentavam como um sistema de factos, mas não transparece na sua obra a defesa de qualquer dualismo ou distinção entre a matéria e o espírito. Com o objetivo de continuar a Revista Portucale que tinha sido praticamente destruída em 1946, no ano de 1947, fundou a Revista Prometeu que manteve até 1952, da qual Mário Kol de Alvarenga (1892-1967), no início, foi juridicamente seu diretor e coproprietário e mais tarde por desentendimento entre os dois a propósito da linha editorial a seguir, a mesma passou a ser propriedade exclusiva de Amorim de Carvalho.

Num período que o seu amigo Álvaro Ribeiro dizia estar marcado pelo “signo vigente que subordina a literatura à filosofia”, Amorim refletiu longamente a relação filosofia-poesia, tão presente na tradição portuguesa, assumindo-se como positivista metafísico, opondo-se às linhas dominantes, na altura, da filosofia portuguesa, adotando como principais referências para a sua reflexão filosófica o pensamento e a obra de Sampaio Bruno e Basílio Teles. Sobre a eterna questão em torno de saber se haverá ou não uma filosofia estritamente portuguesa, debate que ultrapassou o século XX, coloca-se ao lado dos que defendem ser possível uma filosofia de matriz portuguesa. Embora valorizasse de forma supletiva a poesia, defendia que a transcendência e tudo aquilo que se revelasse do domínio do misterioso ou do inacessível, teria, para se poder instituir em comunicação efetiva de um conhecimento que se quer o mais objetivo quanto possível, que se submeter ao saber positivo. Na linha dos pensadores materialistas valorizou as obras em detrimento da fé, considerando que esta, com o recurso ao irracional, mantinha uma série de fenómenos observáveis fora do rigor do método científico.

No campo literário desenvolveu forte crítica à geração da Presença e ao Modernismo. A sua publicação é extensa e dispersa por vários jornais e revistas sobressaindo O Diabo, Diário da Noite, Diário de Lisboa, Diário Popular, Diário de Notícias, Gazeta de Matozinhos, Portucale. Foi amigo e companheiro de tertúlias de Álvaro Ribeiro e Fidelino de Figueiredo, tendo escrito vários textos de análise e crítica sobre o pensamento dos mesmos. A sua obra, para além de ir conhecendo algumas reedições, encontra-se criteriosamente reunida em quase meia centena de volumes pelo seu filho Júlio Amorim de Carvalho que fundou no Porto, a Casa Amorim de Carvalho, sita na Travessa Anselmo Braamcamp, nº 58, onde se encontra catalogada e reunida a totalidade da obra do ilustre pensador, contendo inúmeros documentos pessoais inéditos e uma página na net:

Casa Amorim de Carvalho –Home:
http://www.amorimdecarvalho.com. 

Na Casa, o espólio está à total disposição, para consulta, dos estudiosos e curiosos pela obra do poeta e esteta portuense. Parte dos volumes da sua obra reunida de edição mais recente, estão aqui disponíveis para venda.

Na poesia, literatura e critica poético-literária destacam-se as seguintes publicações: Bárbaros (1927); Destino (1939); Verbo doloroso (1942). Obra poética escolhida. Volume I: Elegia heróica e outros poemas (2013); Volume II: A erotíada e outros poemas (2004); Volume III: A comédia da morte e outros poemas (1979): Volume IV, Il Poverello e outros poemas (2021); Volume V: Com Deus ou sem Deus e outros poemas (2020).

 Contos: A primeira mulher (1952). Romance: A teia da aranha (1962). Tratado de versificação portuguesa. Teoria geral da versificação, 2 vols (1941); Problemas da versificação (1981); Depoimento para a história crítica do modernismo em Portugal (1981); Através da obra do sr. António Botto (1938); Guerra Junqueiro e a sua obra poética (1945); Campos Pereira – um romancista contemporâneo (1947); O Só de António Nobre e o Só de Edmond Haraucourt (1968); Dos trovadores ao Orfeu. Contribuição para o estudo do maneirismo na poesia portuguesa (2012).

Historia e cultura portuguesa: Os Descobrimentos portugueses na filosofia da história (1982); La fin historique du Portugal (1977), edição portuguesa, O fim histórico de Portugal (2000); Teoria da liberdade e das elites. Temas político-sociais (2024).

 

PROMETEU. Revista Ilustrada de Cultura (direção e colaboração) (1947-1952).

Da sua obra filosófica, destaca-se: Deus e o homem na poesia e na filosofia (s/d) (1958?); O positivismo metafísico de Sampaio Bruno (1960); De la connaissance en général à la connaissance esthétique (1973) (impressão do texto que lhe serviu para obter o grau de Doutor em 1970 na Sorbonne); Fidelino: um filósofo da transitoriedade (1974); Estética e teoria da arte (2004) (volume póstumo organizado por Artur Manso e Júlio Amorim de Carvalho); Tese e antítese (2013) (volume organizado e anotado por Júlio Amorim de Carvalho, corresponde ao ensaio inconcluso em que se encontrava a trabalhar na altura da sua morte, tendo permanecido inédito até ao presente ano).

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Artur Manso, nasceu nos idos de 1964, pelo outono, ao cair das folhas, na aldeia transmontana de Izeda. Professor universitário que ao longo do tempo se tem dedicado à aprendizagem e ao ensino de pequenas coisas sob o signo da estética e da ética, do lugar que nos cabe no mundo e de como a beleza nos pode tranquilizar.