DEUS E O DIABO, IDEAIS E COISAS QUE TAIS – por M. H. Restivo

Não fosse por essência o diabo algo a ser odiado, muito o estimaríamos por tão profícuas parábolas que à sua custa ensinam a moral aos homens. Que não se estranhe o facto de o símbolo do mal ser o veículo da moral e dos bons costumes pois de que valeria o bem se não existisse o seu contrário? E, assim sendo, não concebemos um mundo sem inspiração diabólica que, como é sabido, mora bem fundo no coração dos homens. Não obstante, mais pobre seria o mundo caso a inspiração divina não se manifestasse ocasionalmente nos homens, que estes, às penas que sofrem, bem merecem o deleite de uma agradável ilusão. E assim se dá que deus e o diabo, essas tão dignas personagens que põem ordem no mundo, continuem a fazer mossa nos nossos corações impenitentes e avessos à paz. E acreditando nós, por força dos males e dos bens da vida, que há males que vêm por bem e bens que por mal vêm, não arriscamos afirmações de autoria em matérias tão controversas.  Continuar a ler “DEUS E O DIABO, IDEAIS E COISAS QUE TAIS – por M. H. Restivo”

DAS RAÇAS DAS DESGRAÇAS – por M. H. Restivo

As desgraças, quando não sentidas na própria pele, muito agradam aos homens, o que as torna em assunto fecundo para as mais variadas histórias. A história que aqui vos trago é a de Isabel, uma história com desgraças, como qualquer boa história, conseguida a expensas do muito que sofreu. É importante, porém, não esquecer que convém manter a desgraça a uma saudável distância do coração. Não se quer que o verdadeiro peso do sofrimento do mundo invada o nosso íntimo, que isso seria mais trágico do que qualquer tragédia, quer-se, antes, que o leitor sinta com a razão, com a mesma razão abstrata que está na origem das coisas do mundo. Com aquela razão, que não é a razão dos homens, que transforma a morte num bem necessário à vida e que faz
do sofrimento a mais eficiente das estratégias de sobrevivência. Que a morte e a dor, ainda que por demais penosas para os indivíduos, são um bem quando vistas através dos olhos do mundo e nós não somos mais do que matéria fugaz no grande carrossel da natureza. Se na vida, tal distanciamento não nos é possível, aproveitemos as histórias para treinar o nosso olhar sobre um ser que, na luta contra a morte e contra o sofrimento, acaba sempre por lhes sucumbir, cumprindo assim os desígnios mais altos da sua natureza. Continuar a ler “DAS RAÇAS DAS DESGRAÇAS – por M. H. Restivo”