O Relógio
Me apunhalaram. Uma carne fria
com estímulos eletrônicos,
assim deixaram minha alma.
Me arrancaram o susto de vida
e deram corpo ao previsto.
A alma que soprava arrepios
agora é piano sem lírica
e palpável às mãos do mundo.
Carne de metal: não chora,
não contempla. Só vê.
Frio é o afago, como é
também o nosso tempo
– esse homem de muitas portas
e chaves humanas,
e contudo vazio de mistério.
Arrancaram da caixa mágica
a lírica, a música e o susto.
O sangue já não é quente…
O corpo já não me escuta…
Me apunhalaram ainda n’alma
e me jogaram à carne fria
que não chora nem contempla.
Me arrancaram o susto
e no lugar puseram o relógio.
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