O que faz aquele homem sentado sozinho na calçada?
Se for um homem. E por que tem que ser?
Por que meu olhar vê dessa maneira?
Que carta de identidade jogo para conhecê-lo?
Que privilégio isso me dá para nomeá-lo?
Eu sei porque o retratei. Porque fui eu que tirei a foto e o vi sentado ali, numa tarde qualquer. É verdade.
Mas por que nomeá-lo assim, por que julgá-lo assim, se a própria imagem me permite salvá-lo dessa estulta categoria.
Então, reformulo a pergunta: o que essa pessoa está fazendo ali sentada, sozinha, no meio daquela tarde triste que acaba.
Ela sabe que eu a observo de longe, como o mais vil e curioso dos predadores?
Como aquele homem que sou, olhando para mim, imbecil na hora de julgar.
Eu não sei com certeza se sou ele mesmo, mas o que eu no ignoro é que
venho daquele canto fechado nas dores da alma e nunca vi ninguém chorar perto das cidades vazias.
Sei tambén que ninguém nunca viu o riso dos palhaços sem o som da gargalhada.
É assim mesmo que se faz o tempo da loucura.
Percorrer as longas ruas dos povos tristes sem descanso e olhar para um lado e para o outro, como um idiota, a procura de ninguém, o melhor, de si mesmo.
Já vi, nesse trânsito de tardes vazias — acredite em mim —
pássaros-urubus voando na pesada lentidão do céu.
Olham por cima de seus olhos o que já não é mais você mesmo
senão um pedaço do silêncio na cidade esvaziada.
Então a rua esquenta e você chora, alí, sozinho, sentado na calçaza,
com a maquilagem borrado no rosto e se faz uma imagem de si mesmo,
como un antigo animal feroz agora domesticado pelo tempo.
♦♦♦
Nelson González Leal, Fotógrafo, escritor e jornalista. Nasceu na Venezuela, mas mora na Cidade do México. Tem trabalhado como fotojornalista freelancer e se dedica à fotografía documental e de rua. Como escritor, publicou 7 livros (1 de poesia, 3 de relatos, 1 romance, 1 ensaio político y 1 livro de fotografias), publicados entre à Venezuela, à Argentina e à Espanha.
Em 1993 ganhou o primeiro prêmio no concurso de relatos mais importante em seu país natal, o de o jornal El Nacional.
Tem um livro de fotografías sobre o Brasil, publicado na Argentina, algumas exposições na Venezuela, Argentina e Brasil. Neste último país morou por seis anos (de 2004 a 2010, sendo diplomata) e estuduo formalmente fotografia no Espaço F/508 de Brasilia, que agora tem representação en Lisboa.
Nelson González Leal é um homem que gosta de observar e transmitir o que vê, através da palabra e da imagem visual. É em suma só um homem que gosta da fotografía e da literatura, da rua e de o bom café. É alguém que documenta a vida que o rodeia.
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