O PIERROT LUNAIRE A PARTIR DUM ENSAIO DE AUGUSTO DE CAMPOS- por Eric Ponty

 

O PIERROT LUNAIRE E AS SUAS CORRESPÔNDENCIAS

Música de Invenção, São Paulo, Editora Perspectiva, 1998.

A partir dum ensaio de Augusto de Campos

Em 1912, um ano antes da colisão da SAGRAÇÂO DA PRIMAVERA, de Stravinsky, uma outra obra escandalizou as orelhas do século: PIERROT LUNAIRE, de Arnold Schoenberg, um ciclo de 21 poemas de Albert Giraud, em versão alemã de Otto Erich Hartleben, para voz e pequeno conjunto instrumental (piano, flauta e flautim, clarinete e clarinete baixo, violino, viola e violoncelo).

Se não foi um Fruto fundante, Pierrot Lunaire desempenhou extraordinária influência sobre outros compositores. O próprio Stravinsky, que compareceu em Berlim a uma das primeiras apresentações da obra (8 de dezembro de 1912), pagou-lhe homenagem direto em duas das Três Poesias Líricas Japonesas, para voz e pequeno conjunto instrumental.

O Poeta e Tradutor Augusto de Campos nesse importantíssimo e basilar ensaio sobre PIERROT LUNAIRE nós damos à notícia de John Cage:

Quando mais tarde, em nossas vidas, cada um de nós tiver, como um suave leitmotiv na sinfonia das recordações, a visão desta Ilha Ensolarada num cenário de límpidos casus azuis e harmonias celestes, nos sentiremos amplamente recompensados pela entusiástica preparação destes nove dias de retiro espiritual. Seus votos se tornaram realidade com o Pierrot Lunaire:

A cantora não cantava nem recitava. Fazia qualquer coisa entre essas duas coisas. Era o Sprechgesang (cantofalado), uma prática vocal inaudita na tradição musical do Ocidente, Os instrumentos crispavam de dissonâncias os breves melodramas fantasmagóricos, um dos quais, Galgenlied (Canção da Forca), durava pouco mais de 10 segundos. senão era o poema de Número 12 aqui transcriado pelo Poeta e Tradutor Augusto de Campos:

Canção da forca

A virgem hirta
de colo fino
ideia fixa
antes do fim.

Dentro da mente
como um espinho
a virgem hirta de
colo fino.

Como um caniço
de trança e fita,
carícia fina,
lasciva a fita a
virgem hirta.

Segundo o Poeta e Tradutor Augusto de Campos nos esclarece que esses problemas da tradução não são poucos. Segundo CAMPOS: Primeiro lugar, há a própria qualidade do texto utilizado por Schoenberg. NESSA versão alemã de uma adaptação livre, por Otto Erich Hartleben, de uma série de poemas do belga Albert Giraud, em formado de rondes, de treze linhas, com repetição da primeira na 7” e 13” como podemos ver muito bem expresso pelo mesmo.

Segundo o Poeta e Tradutor Augusto de Campos nos esclarece texto alemão não ao rimado como o original, e o ritmo, octossilábico no original, passa a ser mais variado, encolhendo-se as quatro sílabas no poema não 12, Galgenlied (Canção da Forca), ou espraiando-se ao nove no n° 15, Heimweh (Nostalgia):

Nostalgia

Um suspiro de cristal partido traz
da Itália velhas pantomimas à
memória e Pierrô, tão seco, faz
virar sentimental de novo.

No deserto de seu peito oco,
surdamente sobre os seus sentidos,
um suspiro de cristal partido traz da
Itália velhas pantomimas.

Já perdeu Pierrô seus ares tristes
pelo incêndio lívido da Lua, pelos
mares mortos da memória, vai
soar além, num céu longínquo,
um suspiro de cristal partido.

A CANÇÃO DA FORCA

A amante magra com o gasganete longo
Será essa sua última amante distante,
Daquele chifre de leghorn angustiado,
Desse sonho dourado sem um tostão.

Este pensamento é dum feitio do prego
Deixar a embriaguez afundar em sua cabeça:
A amante magra com o gasganete longo
Será essa sua última amante distante.

Sendo tão esbelta feito um bambu;
Em seu gasganete dança uma trança,
E, com carícia estranha carinhosa,
Fará com que venha como um louco,
A amante magra com o gasganete longo.

TRAD. ERIC PONTY

NOSTALGIA

Sendo um suspiro doce e cristalino,
Nessa alma das comédias antigas
De cujas Queixas de rigidez
Lentas, são sentimentais Pierrot.

Em seu triste deserto espiritual
Ressoam quais notas abafadas,
Sendo um suspiro doce e cristalino,
Dessas almas das comédias antigas.

Desaprendendo sua melodia fatal:
Por meio das fogueiras alvejadas
Das Luas expandidas na onda,
Cujos pesares voam para os céus,
Sendo um suspiro doce e cristalino.

TRAD. ERIC PONTY

PIERROT LUNAIRE

Otto Erich Hartleben (1864 – 1905)

12   – Canção da forca

 

Virgem esguia
Num gasganete longo
Será tal derradeiro na
última amante.

Em sua cabeceira
Presa num prego Virgem
esguia
Num pescoço longo.

Jeitosa qual pinheiro
Tranças entornos do gargalo
Vai lhe ser folgazã
Será consorte do malfeitor
Virgem esguia!

TRAD. ERIC PONTY

 

15 – NOSTALGIA:

 

Doce e tão bucólico – Num suspiro cristalino
Duma antiga pantomima italiana,
Parece o Pierrot tão amadeirado…,Já
tão sentimental moderno hoje.

E soa por meio do deserto do coração,
Sons afogados pelo meio de todos sentidos antes,
Se num lindo suspiro cristalino e bucólicos.
Duma antiga pantomima italiana.

Ali Pierrot olvida os bancos de luto!
À luz da chama lívida dessa lua,
Por meio do mar de luz, num anseio sobe.
Valente para alto, para alto, num céu íntimo
Num lamento sedutor, suspiro cristalino e lamentoso!

TRAD. ERIC PONTY

 

Segundo o Poeta e Tradutor Augusto de Campos: Nem o original nem a versão alemã são literariamente muito fortes. O ciclo de poemas de Albert Giraud foi publicado em 1884, anos depois de Verlaine haver popularizado, em Fêtes Galantes (1869), tal tema de Pierrot e outras personagens da Commedia dell’Arte. Para esse ensaio trazemos em rara edição de Paul Verlaine de Fêtes Galantes (1869) com os dois temas citados pelo Poeta e Tradutor Augusto de Campos:

 

 

 

UMA SUGESTÃO PARA O OUVINTE:

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Eric Ponty – Brasileiro de Minas Gerais – É poeta e escreveu o considerado clássico “Menino retirante vai ao circo de Brodowski”.  São Paulo: Musa Editora, 2003.  POEMAS ESCOLHIDOS PELO AUTOR- Rio de Janeiro: Edições Galo Branco,2009. Como tradutor: O Cemitério marinho de Paul Valéry – CINQUENTA MIL DE MILHARES DE POEMAS – RAYMOND QUENEAU – EDGAR ALLAN POE- O CORVO EM UMA E OUTROS POEMAS, Charles Baudelaire. RICHARD WAGNER E TANNHÄUSER À PARIS, – Paris Spleen – Pequenos poemas em prosa – 50 MESTRES DA POESIA além de outros poetas e nacionalidades.