(….) A LUTA DO MRPP – por Francisco Coutinho

18 de Setembro de 1970.
- Atritos, confrontos, rupturas.
E todos aqueles que se orgulham por terem feito a luta do MRPP

O dia 18 de Setembro de 1970 – em que Vidaúl Ferreira, João Machado, Fernando Rosas e Arnaldo Matos iniciaram a reunião na qual estudaram a construção de um partido operário -, constitui a data da fundação do peculiar Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado, que em 1976 originou – a 26 de Dezembro, dia de aniversário de Mao Tsé-Tung – o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP).

Um movimento gerado sem sair do solo lusitano – composto pela EDE, por operários da margem norte do rio Tejo e pela RPAC -, em pleno combate pelo derrubamento do Estado Novo, pelo cessar da guerra nas então colónias portuguesas no continente africano e pela independência das mesmas, numa oposição permanente à corrente pró-URSS.

São muitos aqueles que, sob os pseudónimos, desenvolveram o gosto pela escrita através do “Luta Popular” – o órgão central, várias vezes multado e inclusivamente proibido.

Há quem continue na rotina do partido. Imensos são os militantes que se foram afastando dela e passando a independentes, conforme temos na nossa família. Há também os que foram aderindo a outros partidos – como o PS, o PPD/PSD e o PRD -, algo comummente condenado por sectaristas. Fernando Rosas, muitos anos depois, foi também co-fundador do BE, onde se mantém. E outros ex-membros formaram a UMLP. São diversas as acções cívicas e sociais às quais estão vinculados. A maioria, em qualquer circunstância, continua envaidecida ao partilhar numerosas e preciosas memórias (em sessões públicas, nos livros, nas revistas e nos jornais), sobre madrugadas a colar cartazes secretamente e a pintar deslumbrantes murais, que junta aos dias de forte porrada com grupos afectos ao social-fascismo e ao marcellismo / salazarismo.  E tanto que houve mais.

Talvez a história de um encantador partido seja tudo menos merecedora de sujidade. No entanto, existiu e em momentos diversos.

Foi este uma escola de mulheres e de homens – muitos inscritos, outros simpatizantes – cujas actividades passam no plano mediático (no meio dos quais podemos encontrar Adelaide Teixeira, Ana Gomes, Aurora Rodrigues, Diana Andringa, Dulce Rocha, Maria João Rodrigues, Maria José Morgado, Violante Matos, Martins Soares, João Isidro, Freire Antunes, Saldanha Sanches, João Araújo, Mega Ferreira, António Melão, Danilo Matos, Horácio Crespo, José Lamego, Vítor Ramalho).

É feio recorrer-se ao ataque obsceno, vise-se o convicto e determinado Orlando Alves ou o inquebrantável e demolidor Garcia Pereira (consagrado professor e perito na defesa das classes profissionais, que – na lide desde 1972 – andava na eminência de atingir o muito ambicionado e merecido assento parlamentar, em recentes campanhas, ao lado de homens não-menos aguerridos como João Preguiça, Leopoldo Mesquita ou Luís Franco).

Quem, como Arnaldo Matos, teve anos de instrução nos bancos do liceu (onde participou no apoio à singular campanha delgadista de 1958), na Universidade de Coimbra e na Universidade de Lisboa (instituição na qual teve um triunfante trajecto associativo e já ideológico e onde concluiu a formação que usou numa sensacional vida de direcção, combate e labor), aprendeu que há coisas que são obsoletas e que, posto isto, não devem ser feitas. Coisas que nada têm de honroso e profícuo.

A necessidade da existência de um partido dos proletários, para a defesa e para a dignificação do dia-a-dia dos funcionários do sector público e do sector privado, representa outra razão – mais que suficiente – para jamais se estar a denegrir aquilo que foi erguido por entre agressões, espancamentos e mortes, desde 1970 até hoje. E nenhum de nós a deve ignorar. Sendo que as mais de quatro centenas de camaradas que enfrentaram o COPCON (que as deteve e encarcerou) e aqueles que, antes da insurreição militar e popular de Abril de 1974, estiveram sujeitos à extrema violência igualmente praticada no interior das celas da DGS/PIDE… disso saberão bem. E aqui naturalmente nos deparamos com o brutal exemplo dos activistas assassinados Ribeiro dos Santos e Alexandrino de Sousa, da FDUL e da FEML do MRPP.

A sensatez e a portugalidade levaram a que o movimento não tivesse qualquer complexo em integrar o apoio à candidatura de Ramalho Eanes à Presidência da República em 1976 (suporte renovado pelo partido em 1980), depois de – com o senhor general, com o partido de Mário Soares, com o partido de Sá Carneiro e com Outros – ter enfrentado a linha que defendia o socialismo soviético (formalmente derrotada a 25 de Novembro de 1975). E quem isto conduziu, o histórico Arnaldo Matos, muita versatilidade demonstrou. Muito provou.

Quanto mais admirável alguém se torna, como sabemos, mais propenso fica a causar desilusão. Sendo que na história de vários partidos do nosso país se assistiu a certos comportamentos inesperados e incompreensíveis, levados a cabo por quem menos se imaginava. Neste caso, foi por alguém que se ausentara do quotidiano partidário em 1982.

O tempo é, como de resto foi sempre, um verdadeiro mestre. Um sério instrutor. Dá-nos múltiplos esclarecimentos. E encarregar-se-á de nos mostrar, quando alguém for de facto capaz de fazer tanto ou mais que aquilo que foi sendo alcançado ao longo dos anos, por dedicados militantes como Orlando Alves, Garcia Pereira, João Preguiça, Leopoldo Mesquita e Luís Franco, até Outubro de 2015, para o PCTP/MRPP.

Tratemos da forma mais educada e séria, como fizeram estes senhores, a bandeira vermelha e amarela içada a 18 de Setembro, que continua a esvoaçar nos sonhos e na consciência política de um sem-número de pessoas, volvidas mais de cinco décadas.

‘ texto escrito seguindo a antiga grafia

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Francisco Coutinho, Porto
Ano de 2025,
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